São Paulo, domingo, 2 de outubro de 1994
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Esperanças e desilusões nas eleições presidenciais

JUAN J. LINZ

Eleições são um momento "ritual" de confiança e ilusão. É importante, entretanto, ter em mente os limites do que pode fazer a democracia. Não devemos gerar esperanças demais.
Nem o Estado nem o presidente podem criar, da noite para o dia, funcionários e policiais honestos e competentes; na melhor das hipóteses, podem eliminar os desonestos e incompetentes. Podem criar oportunidades para os empresários, mas, se não houver empreendedores que assumam riscos, não haverá desenvolvimento econômico. Podem criar hospitais, mas não assegurar a preocupação dos médicos com pacientes.
A qualidade de um governo depende de que todos e cada um de nós cumpramos nossa função na sociedade da melhor maneira possível. É preciso haver pessoas dispostas a servir a metas coletivas, e não apenas a um presidente.
O presidente não é um taumaturgo, um milagreiro do qual se deva esperar soluções para todos os problemas. Se se reconhece essa realidade, torna-se mais fácil avaliar, julgar ou criticar a gestão do presidente que se vai eleger e, com isso, apreciar o que a democracia oferece: liberdade e possibilidade de mudar os governantes em paz, sem uso de violência, segundo normas e procedimentos aceitos por todos.
Numa eleição presidencial, os candidatos, muitas vezes, precisam fazer alianças com partidos com os quais prefeririam não se unir. O eleitor tem a opção de votar por um candidato à Presidência, mas não votar no partido ou nos partidos que apóiam sua candidatura.
Isto permite limitar o poder representado pela Presidência, mas também implica que os eleitores que esperam um governo eficaz e forte enfraquecem, na própria votação, aquele que vai governar, dispersando seu apoio entre partidos não-comprometidos com seu programa.
Um presidente pode ver-se sem uma maioria no Congresso que aprova as leis, os orçamentos e a política que ele deseja seguir. O eleitor queixa-se então de que o presidente não se impõe, não cumpre suas promessas (que requerem leis a serem votadas pelo Congresso).
No sistema parlamentarista, o chefe de governo só chega ao posto se seu partido ou a coalizão que o apóia tem maioria na Câmara e lhe dá sua confiança, o que obriga a uma disciplina no voto. Se perde o apoio, a Câmara tem de produzir outro governo ou enfrentar novas eleições.
No presidencialismo, é mais difícil governar, sobretudo se há muitos partidos fragmentados, onde os deputados representam interesses locais ou setoriais. O presidente precisa conquistar um a um os votos de deputados e senadores. Uma maneira é "comprar" seu voto com concessões, o que resulta, às vezes, em gastos públicos não justificáveis. Então os cidadãos se queixam do déficit público, da inflação.
A imagem popular dos presidentes é que eles podem resolver tudo, quando a realidade é que a Constituição limita seus poderes e os divide com o Congresso. Assim, vemos como, diversas vezes, os presidentes contam com alto nível de aprovação no início de seus mandatos e, após algum tempo, essa aprovação cai muito. Chefes de governos parlamentaristas não geram tantas esperanças, nem tantas desilusões.
Aos brasileiros, as eleições oferecem a oportunidade para um otimismo racional, sem resvalar para uma utopia irreal nem para um cinismo que possa ter sido gerado, em um passado não distante, por falhas de pessoas e do sistema.

Tradução de Clara Allain

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