São Paulo, domingo, 2 de outubro de 1994
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Eleições e mudanças no Brasil

ANTONIO KANDIR

Chegamos à véspera das eleições de 3 de outubro. Há seis meses, para não dizer menos, quem poderia prever que o quadro eleitoral seria este, com FHC podendo tornar-se presidente da República sem necessidade de um segundo turno?
Ninguém discute que a causa imediata da decolagem do candidato do PSDB rumo à liderança tenha sido o Plano Real. Tampouco cabe dúvida sobre sua importância na sustentação da candidatura tucana em patamar superior a 50% dos votos válidos. Mas não creio que o plano baste para explicar a grande convergência nacional que estamos assistindo em torno e sob a liderança de FHC.
O eleitorado vota olhando para a frente e não apenas com base na situação presente. Prefere, entre os candidatos, quem lhe permita sentir maior confiança no futuro do país e, nessa medida, em seu próprio.
Evidente que o Plano Real, na medida em que mudou para melhor a situação presente, empresta força e credibilidade excepcionais à promessa encarnada na candidatura de FHC.
Não houvesse, porém, uma perspectiva crível de futuro embutida no plano, uma perspectiva que incorpora a estabilização econômica, mas vai além dela, dificilmente seria tão larga a vantagem do candidato tucano sobre os demais.
O que faz dela uma perspectiva crível, que provoca tamanha convergência, não são apenas os atributos individuais do candidato. Mas, sobretudo, a sintonia entre a candidatura de FHC e as transformações reais da sociedade brasileira e do mundo nos últimos anos.
A simbologia política que se constrói em torno de uma candidatura é indispensável para tornar a mensagem do candidato assimilável pela grande massa do eleitorado. Todavia, se estiver errada a visão do país e do mundo sobre a qual se ergue, não há "marketeiro", por mais genial que seja, capaz de resolver o problema.
A larga vantagem de FHC não se deve, assim, apenas a equívocos e acertos circunstanciais, mas fundamentalmente à percepção mais correta, porque mais informada e menos dogmática, mais enraizada no real e menos ideológica, da realidade nacional e internacional, em seus aspectos estruturais.
Esse elemento tem maior peso nesta eleição do que teve na eleição passada. Primeiro, porque nos últimos cinco anos o país amadureceu, desfez ilusões, a principal delas a de que é possível conviver com a inflação, e deu de cara com seus reais desafios, o maior deles o de conciliar a internacionalização econômica com a melhoria ampla dos níveis de bem-estar.
Segundo, mas não menos importante, porque o Plano Real interrompeu a trepidação inflacionária que nos impedia de ver o país com maior nitidez.
Pudemos perceber então que, embora injusto, marcado por profundas desigualdades sociais e regionais, cheio de problemas, o Brasil não é a desgraça que alguns propagandeiam ser, não esteve paralisado nos anos de crise, não é uma sociedade de miseráveis esmagados por uma "crosta colonial".
Não é de hoje que o PSDB e suas principais lideranças têm insistido na tecla de que, para melhorar a qualidade de vida dos brasileiros, é preciso vencer o desafio da internacionalização econômica.
De que vencer o desafio da internacionalização exige políticas de liberalização (abertura econômica, desregulamentação, privatização, flexibilização de monopólios, etc.), mas que elas precisam ser acompanhadas de uma reforma do Estado, não para torná-lo mínimo, mas para torná-lo competente, sob pena de que se tenha uma modernização capenga.
Entre a vulgata neoliberal e o dogmatismo nacional-desenvolvimentista, cada dia mais envelhecido e cego à realidade, o PSDB e FHC foram se afirmando como alternativa. Se amanhã as urnas confirmarem o que todas as pesquisas indicam, o Brasil estará dando um passo decisivo na direção certa.

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