São Paulo, domingo, 2 de outubro de 1994
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Os rapazes da rua da Cantareira

LUÍS NASSIF

Os homens que comandam a especulação com feijão no Brasil cabem numa kombi. Se a Fazenda, a Receita ou a Polícia Federal quiser conhecê-los pessoalmente, é simples.
Basta descer na Estação da Luz, em São Paulo, atravessar a Duque de Caixas, entrar na rua Mauá e dobrar na última à direita, a rua da Cantareira.
Lá opera a famosa "Bolsinha", um foco especulativo com décadas de existência, que ainda não foi varrido do mapa pelos ventos da modernização.
São quatro ou cinco atacadistas, com frotas de caminhão que percorrem todo o país recolhendo as safras de pequenos produtores, em geral sem esses detalhes burocráticos de notas fiscais.
Quando seus armazéns já estão abarrotados, os quatro ou cinco cavaleiros do apocalipse procedem a manobras especulativas usuais, manjadas, mas quase sempre bem-sucedidas, porque nossos vigilantes economistas julgam que demanda agregada é conceito abstrato, que prescinde de personagens de carne e osso.
Seria muito simples resolver essa pressão especulativa que incha os índices de inflação e esvazia as mesas. Há feijão disponível na praça e nem a seca dos últimos dias justifica esse jogo especulativo.
No curto prazo, resolve-se a questão com uma visita da Receita e do Ministério Público, para uma boa conversa dissuasória.
Como bons patriotas, os rapazes da rua da Cantareira são suscetíveis aos apelos da pátria. Principalmente se os mensageiros forem fiscais da Receita.
No médio prazo, tem que se jogar o holofote das Bolsas sobre essas atividades semiclandestinas.
O ex-ministro Antônio Cabrera deixou encaminhados no Ministério da Agricultura projetos de criação de Bolsas eletrônicas, capazes de integrar os produtores, impedindo que se transformassem em massa de manobra desses manipuladores.
O governo Itamar abandonou esse projeto. Talvez porque, a exemplo do Fusca, o presidente julgue que bolsa eletrônica é frescura de país rico.
Narcisos

Em sua atração por microfones e câmeras, o procurador-eleitoral Sepúlveda Pertence é bastante parecido com o ex-árbitro de futebol Armando Marques. Há em ambos uma compulsão de aparecer mais do que os próprios jogadores.
Em outros tempos, uma das virtudes da magistratura, tanto na Justiça quanto no futebol, era a discrição.

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