São Paulo, domingo, 2 de outubro de 1994
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Pode parecer ficção, mas é real

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – O Datafolha revela hoje um fato histórico: o presidente Itamar Franco é o político brasileiro mais sortudo de que se tem notícia. Podem pesquisar nos livros –duvido que encontrem exemplo que chegue a seus pés.
Segundo a pesquisa, ele tem hoje 81% de aprovação dos brasileiros. O plano econômico de seu governo está quase no mesmo patamar: 75%. É uma taxa que, até para começo de mandato, seria alta.
A partir de amanhã, ele deve ostentar um troféu raríssimo: um presidente ver seu candidato substituí-lo. Um dos maiores estadistas brasileiros, Juscelino Kubitschek teve em seu mandato uma estupenda onda de crescimento econômico, fez obras por todos os lados, estimulou a industrialização, governou com notável tolerância. Viu-se, porém, obrigado a dar posse a Jânio Quadros, montado no tema da corrupção.
Itamar sequer ganhou nas urnas. Beneficiou-se de dois terremotos. Um deles elegeu Fernando Collor; outro, derrubou-o. Presidente, cometeu erro atrás de erro, montou um ministério medíocre. Ministros caíam como moscas. A inflação e o desemprego subiam. Continuaram até mesmo as denúncias de corrupção.
Até o final do ano passado, ele próprio considerava a idéia de ir embora mais cedo, antecipando as eleições. No Carnaval deste ano, sua imagem esmigalhou-se no sambódromo, ao aparecer ao lado da manequim Lilian Ramos.
Era o terror do Ministério da Fazenda. No seu despreparo, criava embaraços, insistia em medidas capazes de implodir o plano de combate à inflação: queria queda abrupta de juros, aumentos salariais, e assim por diante. Fernando Henrique ameaçou demitir-se diante das pressões.
A força de Itamar Franco surgiu justamente de sua extrema fraqueza. Depois de tantos insucessos, estava vulnerável à pressão de seu ministro da Fazenda, em meio à elaboração do plano econômico.
A julgar pelas pesquisas, estamos prestes a assistir um fato histórico: não apenas um presidente que faz um candidato. Mas, sobretudo, um candidato que faz um presidente. Parafraseando a CUT, pode parecer uma ficção, mas é real.

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