São Paulo, terça-feira, 4 de outubro de 1994
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Figueiredo se diz 'desiludido'

FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO

O ex-presidente João Baptista Figueiredo, 76, disse ontem, depois de votar, que está ``desiludido" com a política brasileira desde a abertura e que o Plano Real ``é irreal".
``Pensei que eles fossem fazer uma democracia como eu sonhava, e não isso que está aí, esse conchavo. Dizem que o meu governo foi sujo, meu Deus do céu! Isso que está aí não é democracia, é uma sujeira que eu nunca vi igual", afirmou.
Figueiredo votou às 11h em Nogueira, distrito de Petrópolis (a 66km do Rio). Ele confirmou o voto em seu irmão Euclydes Figueiredo para deputado federal e no general Newton Cruz (PSD) para governador, mas não declarou seu candidato a presidente.
Para Figueiredo, o governo federal mentiu quando garantiu ao povo brasileiro que o Plano Real não era uma dolarização.
``Inventaram uma moeda com o nome de real, que passou a valer mil réis. É irreal. Mentiram que não era dolarização e foi pior, porque a nova moeda passou a valer mais que o dólar", afirmou.
``Temos preços dos Estados Unidos e salários de Gana", declarou o ex-presidente. Segundo ele, a situação da população piorou, e o governo deixou os preços subirem à vontade.
Figueiredo defendeu modificações na Constituição e disse que não acreditava num plano econômico feito sem reforma fiscal e tributária e sem controle do déficit público.
Ele se disse descrente dos políticos e da possibilidade de mudanças com a eleição deste ano. ``Com esses homens que eu estou vendo aí candidatos... São os mesmos...", comentou.
``Quem está na cadeia por causa da CPI? O Collor está? Só PC Farias foi. Mais alguém?", perguntou. ``Os maiores ladrões renunciaram e vão voltar agora", declarou.
Para Figueiredo, ``só uma minoria dos políticos presta". ``Tirando essa porcentagem pequena boa, o resto não presta para nada, pode jogar no lixo", afirmou.
Ele defendeu uma reforma partidária para evitar o abuso de poder econômico nas eleições. ``Eu disse para o Newton (Cruz) que ele não ia se eleger, porque ele não tem dinheiro."
João Baptista Figueiredo foi o último presidente militar, de 1979 a 1985. Não transmitiu o cargo ao sucessor José Sarney e, depois que deixou o governo, pediu para ser esquecido.
Ao votar, ontem, foi reconhecido na fila por alguns eleitores. O ex-presidente recupera-se de uma cirurgia na vista.
Saiu da seção eleitoral dizendo que os analfabetos teriam dificuldade para votar e reclamando do processo político brasileiro: ``Vamos ver, vamos ver. Como eu já estou lá no fim, vou assistir lá do céu."
O general Newton Cruz, candidato do PSD ao governo fluminense, foi chefe do Comando Militar do Planalto durante o governo Figueiredo.
Cruz foi responsável por um dos maiores atos de repressão no período de abertura política promovida pelo regime militar.
O general sitiou Brasília com tropas do Exército para impedir manifestações em defesa das eleições diretas para presidente.

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