São Paulo, domingo, 9 de outubro de 1994
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Precisa-se: final feliz

MOACYR SCLIAR

– Você conhece esse ator que foi preso por não pagar a pensão alimentícia?
Eu disse que sim, que conhecia o Paulo Cesar Pereio, uma de minhas antigas admirações: um grande ator, um dos maiores do Brasil. O homenzinho sorriu:
– Me alegra que você goste dele. Porque eu também gosto. E quero muito ajudá-lo.
A primeira coisa que me ocorreu foi: ele vai se oferecer para pagar a pensão alimentícia e quer saber como enviar o dinheiro. Mas não era isso. A ajuda que imaginava era de outro tipo, como logo constatei quando abriu a pasta que carregava e tirou de lá um maço de papéis.
– Sabe o que é isto?
Claro que eu não sabia; ele então explicou:
– É uma peça de teatro. Eu a escrevi esta noite, depois de ler a notícia sobre o Pereio. É uma peça sobre um ator de teatro preso por não pagar a pensão alimentícia. Aí ele recebe a visita de um misterioso senhor que lhe entrega uma pasta. Dentro, está o dinheiro para pagar o que está devendo e também um manuscrito; que é, justamente, uma peça de teatro, uma peça de teatro maravilhosa sobre um ator que está preso por não pagar a pensão alimentícia, mas aí recebe uma misteriosa doação e tudo muda em sua vida... O que é que você acha? O meu texto pode mudar tudo, não pode?
Tão ansioso estava que não tive coragem de discordar. Sim, eu disse, o texto pode mudar tudo. E ele se foi, com sua peça de final feliz, deixando-me um recorte de jornal que falava de pensão alimentícia atrasada, de processo judicial e de prisão. A vida, como o teatro, às vezes precisa desesperadamente de um final feliz.

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