São Paulo, domingo, 9 de outubro de 1994
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A opção do contrato coletivo

CÁSSIO MESQUITA BARROS JR.

A menção do presidente eleito ao contrato coletivo salarial, na fluente e lúcida entrevista à imprensa, reacende o debate sobre o modelo de relações do trabalho do país. Afinal temos de decidir: continuar o arcaico sistema vigente ou partir para estruturas mais modernas, democráticas e legítimas. A decisão parece tomada.
O Brasil, como de resto os países da América Latina, está empreendendo um decidido caminho para a reestruturação de suas economias. A abertura para o mercado internacional, as reformas do aparato do Estado, as privatizações, a descentralização e a regionalização estão na ordem do dia e na agenda das políticas macroeconômicas.
É preciso, pois, aprofundar o sentido da expressão ``contrato coletivo".
É certíssimo que a característica marcante dos modelos avançados de relações do trabalho é a preponderância da negociação coletiva sobre outros mecanismos de determinação de salários e condições de trabalho.
A questão básica nos países latino-americanos é a intervenção do Estado no processo negociador, fenômeno tão complexo e transcendente que se chega a pensar que sem o intervencionismo não existiria a negociação coletiva.
As muletas da legislação promocional, concretizada operacionalmente em impulsos enérgicos dos Poderes Executivo e Judiciário, apresentam efeitos indesejados e dependências asfixiantes e sua supressão assusta pelo temor de síndromes de abstinências.
O peso que tem a lei e a presença de autoridade pública é impressionante. A técnica intervencionista invade todos os aspectos da autonomia coletiva. Por outro lado, a vertente do direito nas relações individuais com a regulamentação minuciosa do ``status" do trabalhador dependente mostra a mesma lógica intervencionista. Não é pois de estranhar que a exigência de tutela do contratante débil tenha reflexos na pormenorizada disciplina dos seus momentos de vida coletiva.
Aqui aparece os temas de composição do conflito coletivo, ocasião em que as regras heterônomas enjaulam a capacidade normativa dos sujeitos coletivos, anulando o valor da composição e prevenção do conflito atribuído à negociação coletiva.
Modelos estrangeiros não são, em princípio, exportáveis porque são produtos de determinadas circunstâncias históricas. As diferenças entre os países são de tal calibre que se tem constituído conselhos de empresa nos diversos países, a fim de que neles trabalhadores, empresários e os próprios governos sejam melhor informados e consultados.
A expressão ``contrato coletivo" já existiu na Constituição de 1937 para significar o entendimento sindical sobre condições coletivas de trabalho. A Constituição de 1946 substituiu essa expressão por ``convenção coletiva", designando acordo intersindical, e ``acordo coletivo", particularizando condições coletivas de trabalho entre sindicatos e empresas.
As Constituições posteriores mantiveram as mesmas entidades. Isso quer dizer que o ``contrato coletivo" não tem configuração legal no Brasil.
Na escalada da modernidade incumbe identificar os valores a preservar, objetivar as características, o conteúdo, se exclusivamente salarial ou mais amplo, bem como o âmbito do contrato coletivo, se permanece somente no setor privado da economia ou abrange também o servidor público. Também é preciso determinar os deveres, fases e variantes do instrumento normativo.
As realidades deste país tão grande, onde regiões não tem nenhuma vida sindical, apontam para um modelo misto. A falta de instrumento normativo determina a aplicação dos preceitos legais de proteção para não deixar desprotegidos os trabalhadores.

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