São Paulo, domingo, 9 de outubro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Policial acredita em predisposição genética

ALESSANDRA BLANCO
DA REPORTAGEM LOCAL

Gregg McCrary é a ``versão real" do personagem vivido por Jodie Foster em ``O Silêncio dos Inocentes". Policial, treinado em psicologia, integra uma equipe de elite do FBI especializada em analisar crimes violentos e sem razão aparente.
McCrary caçou durante 18 anos um ``matador de família" (``family mass murderer"): John List, um vendedor de seguros, que um dia matou sua mãe, mulher e três filhos, na mansão em que moravam em New Jersey.
List deixou um bilhete confessando o crime, enfileirou os corpos e fugiu. A polícia demorou um mês para descobrir os corpos e passou 18 anos sem pistas do criminoso.
Em 1989, o FBI divulgou pela televisão uma ``fotografia", feita em computador, de como seria o rosto de List. Recebeu 300 telefonemas e prendeu um homem chamado Robert Clark em Richmond (Virginia).
Clark já tinha se casado novamente e até hoje nega ser List. Preso, aguarda julgamento.
Pelo telefone, da sede do FBI (em Quantico, Virginia), McCrary contou à Folha como prendeu List e o que ele pensa sobre os ``matadores de famílias":
Folha - Como o sr. analisa um crime como o ocorrido no interior de São Paulo?
McCrary - É difícil dizer exatamente o que aconteceu porque não conheço o garoto e nem detalhes do caso. Mas posso afirmar que, com certeza, aconteceu alguma coisa naquele dia, um estopim talvez, que levou o rapaz a matar sua família naquele momento. O motivo do crime pode até estar fora da família, no trabalho, namoro, mas algum incidente aconteceu naquele dia.
Folha - O sr. acredita em loucura momentânea?
McCrary - Não. Alguém que faz isso pode ser louco, mas geralmente não é o caso. Por sua descrição, ele não tinha problemas mentais e era capaz de cumprir suas funções muito bem na sociedade –no trabalho e na escola. Tinha uma vida normal. Além disso, depois dos assassinatos, ele tentou simular um roubo, pegando o videocassete e outros aparelhos. Não estava, portanto, insano.
Folha - Normalmente esses criminosos estão lúcidos quando cometem os assassinatos?
McCrary - Sim.
Folha - Como definir se são loucos ou criminosos?
McCrary - Ele deve ser avaliado por um bom psiquiatra. E deve ser levado em conta a outra parte de sua vida. Neste caso, pessoas que têm problemas psiquiátricos geralmente não têm sucesso no trabalho e daí por diante. Se ele tem uma vida normal, eu diria que provavelmente ele não é louco. Ele deve ter uma personalidade violenta.
Folha - Nesse caso, ele pode ser um criminoso?
McCrary - Sim. É mais um criminoso do que louco. Mas é difícil de dizer porque não conheço esta pessoa e não analisei o caso.
Folha - Qual foi o pior caso em que você já trabalhou?
McCrary - Foi o de John List. Ele matou a família, sua mulher e as crianças. Ele não era louco. Fugiu, mudou de identidade, construiu uma nova vida, mas acabou capturado.
Folha - Todos esses criminosos apresentam tendências suicidas?
McCrary - Às vezes, não sempre. O verdadeiro criminoso geralmente não tenta se matar.
Folha - No Brasil, em todos os casos, os criminosos eram pessoas com uma vida normal. Nos EUA ocorre o mesmo?
McCrary- Sim e não. Novamente temos pessoas que não são loucas, são somente criminosos. Tivemos um médico de sucesso que matou a mulher e o filho.
Folha - As causas podem ser biológicas?
McCrary- Ninguém sabe ao certo. Acredito que essas pessoas têm uma predisposição genética à violência e também sofrem influência do ambiente, como muito estresse. Há pessoas que têm predisposição a serem violentas e muito estresse em suas vidas pode torná-las assassinas.
Folha - Há algum tratamento específico?
McCrary - Não que eu conheça. Há muitas controvérsias. Estas pessoas têm que ter uma boa avaliação de um psiquiatra para saber se têm algum problema mental. Se for somente um criminoso e não um louco, não há tratamento que eu conheça que funcione (risos).
Folha - Por que eles sempre tentam enganar a polícia e só confessam 48 horas depois?
McCrary - Eles sabem que fizeram algo errado e tentam encobrir o crime, encenar. Eles não são loucos e entendem bem o que fizeram.
Folha - Eles não são loucos?
McCrary - Em geral, eles são apenas criminosos. Normalmente, são apenas maus.

Texto Anterior: Leis eleitorais definitivas exigem coragem
Próximo Texto: Psiquiatra recusa tese de crime calculado
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.