São Paulo, domingo, 9 de outubro de 1994
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O sinal de alerta das urnas nesta eleição

GUILHERME AFIF DOMINGOS

Os resultados das eleições para os cargos majoritários não estão demonstrando grandes surpresas. Até porque as pesquisas que captaram o anseio do eleitor pela estabilidade econômica vêm sendo confirmadas pelas urnas.
Como temos alertado mensalmente por meio da publicação ``Olho Vivo Cidadão" –avaliação da atividade legislativa distribuída pela Confederação das Associações Comerciais do Brasil a todos os seus membros– o que chama a atenção é o enorme divórcio entre a sociedade e seus representantes no Congresso Nacional e nas Assembléias Legislativas.
A principal reforma sinalizada pelas urnas como vontade soberana do povo é a do sistema político. A falta de partidos com programas coerentes, a ausência de fidelidade a esses mesmos partidos, a inexistência do voto distrital que vincule o eleitor ao eleito são os fatores que geraram crescente desinteresse dos eleitores, demonstrado, nos últimos dez anos, pelo alto índice de abstenções, votos nulos e em branco.
Não adianta reclamarmos dos políticos, dizermos que eles não prestam, que não nos representam e que não votaremos em ninguém, se esse protesto das urnas não se transformar numa pressão ativa da sociedade por reformas.
O presidente eleito, Fernando Henrique Cardoso, não pode esconder esta realidade. Democrata que é, sabe que um governo com equilíbrio é aquele que conta com uma representação popular autêntica para sinalizar os caminhos a serem seguidos. Não adianta remendar a ausência de representação criando, por exemplo, câmaras setoriais, onde só têm assento interesses corporativos.
Esta é uma distorção do nosso sistema, herdada do corporativismo fascista do Estado Novo, que precisa ser banida para que tenhamos um regime democrático o mais próximo possível da realidade e dos anseios de um país continental como o nosso.
As grandes distorções da estrutura do Estado brasileiro, responsáveis pela desestabilização crônica que ainda experimentamos, têm origens no sistema de representação política. A resposta das urnas está sendo contundente. O povo sinaliza o desapontamento da sociedade com aquilo que foi revelado a partir da CPI do Orçamento.
O sistema parlamentar se mostrou mais fiel ao seu financiador do que a seus eleitores. A imagem de balcão de negócios do Congresso criou na sociedade a sensação de que cada um mercantiliza o seu mandato de acordo com seus interesses e da corporação a que representa.
Esta situação só pode ser alterada, para o bem da democracia, com uma profunda reestruturação do sistema político, sob pena de, ao crescer o desapontamento, a próxima eleição ser anulada pelo número de votos nulos. Chega, não podemos mais ser contemplativos!
Não adianta o protesto passivo. Ele tem de ser ativo. Os Estados Unidos, exemplo de democracia estável, têm no voto distrital e na participação ativa da sociedade a base do seu equilíbrio.
Quando desenvolvemos o Serviço de Proteção ao Crédito Político (SPCP), através da publicação ``Olho Vivo Cidadão", sabíamos que este era o melhor caminho para organizar as forças produtivas do país.
Posteriormente, tomamos conhecimento da existência de um movimento semelhante ao nosso, no Congresso norte-americano, chamado ``Small Business Tax Action Committee" (Comitê de Ação Tributária), que fiscaliza os aumentos de tributos sobre a sociedade.
Sua publicidade tem um lema: ``Dar poder e dinheiro aos governos é o mesmo que dar uísque e chave do carro para um adolescente". É uma palavra de ordem: ``Play or pay", ou seja, participe ou pague a conta, demonstrando que a sociedade que não acompanha a ação dos poderes vai pagar a conta da orgia.
Esse tipo de movimento acontece em todas as democracias do mundo. Por isso estamos lançando uma campanha de adesão ativa pelo ``Olho Vivo Cidadão". Não basta receber o boletim semanal e o jornal mensal. O cidadão que assinar o ``Olho Vivo" tem de ser membro ativista, cumprindo a ``palavra de ordem" como uma corrente cujos elos não podem ser quebrados.
Sempre que nós sinalizarmos a necessidade de assumir uma atitude, seja de crítica ou elogio, os elos dessa corrente responderão com unidade. Com essa força, teremos condições, desde que ninguém falhe, de influir nos destinos do nosso país.
Informação é poder, desde que haja uma força organizada que saiba utilizá-la. Esta é a nossa proposta. Olho Vivo, cidadão!

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