São Paulo, segunda-feira, 17 de outubro de 1994
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Rio mostra 101 obras de Georges Braque

SÉRGIO AUGUSTO
DA SUCURSAL DO RIO

A gente pára diante de ``Les Amaryllis" e até se esquece da frustração de não estar vendo outra mostra: aquela que há cinco anos juntou (ou misturou) no MoMA de Nova York 350 obras cubistas de Picasso e Georges Braque.
Em matéria de natureza-morta, poucas se igualam às lutuosas liliáceas que o gênio de Argenteuil gravou em 1957. Ótimo tê-las entre nós: melhor ainda que ao lado delas haja cem outras litogravuras, águas-fortes, pontas-secas e guaches nunca vistos nestas paragens e cobrindo um período que vai de 1907 até o ano (1963) em que Braque morreu.
Cortesia do Museu Maeght de Paris para o Centro Cultural Banco do Brasil, que com esta exposição, inédita na América Latina, celebra, junto com outros eventos de menor vulto, o seu quinto aniversário. E ajuda os cariocas a aplacarem sua inveja da bienal paulistana.
As pontas-secas e águas-fortes têm por estrutura de base a linha, ao passo que nas litogravuras o que predomina é a cor –cores francas, mais claras que as dos quadros, aplicadas sobre motivos que se repetem obsessivamente. As águas-fortes vieram antes: ``Estudo de Nu", a primeira de todas, gravada em 1907, presumo que ainda em L'Estaque, lembra, não por acaso, uma ``demoiselle" de Avignon. Ao que tudo indica, foi a primeira gravura cubista ou pré-cubista.

Cubismos
Quatro anos depois, Braque iniciaria sua simbiótica temporada em Ceret, ao lado de Picasso, seu ``companheiro de milagres", segundo Jean Cocteau. Há oito gravuras daquele período, absolutamente cubistas. Todas assinadas. Só nos quadros concebidos em Ceret que Braque não pôs o seu jamegão. Picasso tampouco assinou os seus. Puro ``trompe l'oeil" autoral: os dois, de comum acordo, pintavam quadros parecidos sem paternidade nítida, iludindo até os entendidos. Ainda hoje muitos visitantes do MoMA não conseguem distinguir quem pintou, por exemplo, ``Acordeonista" (Picasso, 1911) e quem pintou ``Homem Com uma Guitarra" (Braque, idem).
Nove em cada dez visitantes da exposição vão dizer que certas gravuras de Braque poderiam ter sido feitas por Picasso. As diferencas são sutilíssimas. Wilhelm Uhde, marchand alemão e um dos primeiros a comprar obras cubistas, distinguia Braque por sua limpidez, precisão e por seu espírito burguês. Picasso era, segundo ele, mais sombrio, excessivo e revolucionário.
O próprio Braque reconhecia não ser um pintor revolucionário. ``Não busco a exaltação: o fervor me basta", confessou num dos seus rabiscos. Precisão sugere equilíbrio, uma postura mais apolínea. Para Braque, a perfeição parecia estar no meio, onde a emoção corrige a regra e a regra corrige a emoção.

Mitologia
Um dos destaques da exposição são as ilustrações de ``Teogonia de Hesíodo", 16 águas-fortes gravadas em 1932. Braque retomaria, depois da guerra, o filão mitológico, litogravando Hélios, Perséfone, Talassa e até mesmo Hesíodo, em outras teogonias helênicas. Para afinal fazer sua mão voar com os pássaros, que apesar de mais pesados que o ar moviam-se com mais convicção do que todos os outros pássaros pintados.
Assim ao menos acreditava Francis Ponge, certo de que eles, como os pássaros de verdade, tinham por hábito voltar ao solo em busca de alimento.

Exposição: Georges Braque
Sinopse: 101 litogravuras, águas-fortes, pontas-secas e guaches do pintor cubista francês
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil (r. 1º de março, 66, tel. 021/216-0223, região central do Rio de Janeiro)
Quando: até 18 de dezembro
Visitação: de terça a domingo, das 10h às 22h
Entrada: franca

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