São Paulo, quarta-feira, 19 de outubro de 1994
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Um momento já vivido

JANIO DE FREITAS

O Plano Real está naquele momento em que todos percebem que é preciso fazer uma intervenção enérgica para protegê-lo da inflação retornante, mas o governo não se dispõe a mais do que medidas de já comprovada ineficácia. É o caso do aumento dos juros, com que o ministro Ciro Gomes supõe estar combatendo o crescimento da inflação.
Durante a permanência de Fernando Henrique Cardoso na Fazenda, o presidente desistiu da sua convicção de que os juros precisavam baixar. Continuaram nas alturas, livres. E a inflação que Fernando Henrique encontrou em 26% foi por ele deixada em 43%. Assumiu Rubens Ricupero, juros mantidos na estratosfera, e a inflação do pré-real foi aos 54%. Se os juros tiveram alguma contribuição naqueles 13 meses, foi a favor da inflação.
Indústria e comércio que dependam de operações financeiras para suas atividades repassam os juros elevados aos preços. Os que não dependem, mas compram matéria-prima ou bens acabados das primeiras, são levadas a aumentar seus preços também. E os que não estão em um caso nem outro, não têm por que manter seus preços abaixo do que o mercado está praticando ou, do contrário, abririam mão de lucros maiores.
Mas juros elevados reprimem o consumo, argumentam os economistas, e com isso forçam a contenção dos preços e, portanto, da inflação: ``Vão ter que baixar os preços ou não haverá comprador", disseram Roberto Macedo quando aumentados os juros na gestão de Marcílio Moreira e Edmar Bacha na gestão de Fernando Henrique. Os juros subiram, os preços não baixaram e ainda subiram mais, a inflação passou do trote ao galope.
Na visão do analfabeto em economia ``científica", que é o meu caso e dos números facilmente comprováveis, os preços não precisam baixar por dois motivos paralelos. O primeiro é que o Brasil dispõe, na pior hipótese, de 20 a 30 milhões de pessoas em condições de manter constante o seu consumo. A outra é que produtores e comerciantes têm um mecanismo fácil à sua disposição: quando o número de compradores cai, o preço é aumentado para manter a margem de lucro empresarial com menos vendas. Estes fatores só se alteram em condições de anormalidade extremada. O que não é o caso atual, nem figura nas previsões.
Estamos, neste momento, reprisando o que já vimos nos vários planos anteriores. E ouvindo as mesmas coisas: os comerciantes advertindo para os preços mais altos dos seus fornecedores, o governo brandindo no ar ameaças velhas e já gaiatas.

Correspondência
Waldeck Ornellas, dado como eleito para o Senado pela Bahia com apenas 3 mil votos de vantagem, em 2,6 milhões dados a ele e a seu adversário Waldir Pires, escreve-me para argumentar que ``o próprio Datafolha, em relatório de 19 de setembro, já dizia que Waldir Pires perdeu 5% e Ornellas obteve agora seu melhor desempenho crescendo quatro pontos. Tal resultado promete uma disputa acirrada pelo segundo turno".
Não faz, porém, e creio que não pudesse fazê-lo, demonstração de que alguns fatos de sua votação são ilógicos, como foi dito aqui. Dada a convicção expressa de que venceu com toda a legitimidade, suponho que, por isso mesmo, não se oporia à recontagem dos votos, para que sua presença no Senado não se cercasse de suspeições de ilegitimidade.

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