São Paulo, quarta-feira, 19 de outubro de 1994
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Oliver Stone assina tratado barroco sobre a banalização da imagem

MARCELO REZENDE
DA REDAÇÃO

``Assassinos por Natureza", que abre hoje a 18ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, não é um filme razoável. Nem participa da idéia de um cinema razoável. Antes, o último filme do diretor Oliver Stone é uma espécie de tratado barroco sobre a violência na América.
Um tratado que trabalha com elementos simples, quase banais. ``Assassinos" mostra, em essência, a história de um casal que se ama e que luta radicalmente contra a idéia da separação. Um amor nascido da idéia de desajuste. Um casal que adora matar pessoas.
Mais do que as aventuras de um casal psicopata (ou melhor, um casal sociopata, já que o que mais os incomodam são regras a serem obedecidas), o que o filme de Stone procura é uma crítica feroz a tudo que o cerca.
O que leva naturalmente a um mergulho na mitologia do diretor: a crítica esquerdizante sendo conduzida de uma maneira quase infantil, a ``memorabilia" dos anos 60, com sua música e seus ideias místicos –assim como em ``The Doors" ou ``JFK", a iluminação dos personagens acontece sempre através de uma mensagem vinda de um estranho– e, acima de tudo, de um rigoroso apuro técnico.
E é extamente aqui que ``Assassinos por Natureza" possibilita a sua melhor e mais interessante leitura. O que há de tão terrivelmente novo em um filme com uma edição anfetamínica, em uma mistura de clipe, vídeo e super 8. Enfim, em uma soma de linguagens?
Oliver Stone pretendia que seu filme fosse entendido como o resultado de uma visão ácida sob a linguagem da televisão. Talvez por isso sua necessidade em estabelecer um vínculo entre sua ficção e o que ele tem como realidade. Durante todo o filme imagens ``jornalísticas", com criminosos reais (e conhecidos da mídia, como O.J. Simpson e Lorena Bobbit), são jogadas diante dos olhos.
Mas o que Stone estabelece com sua patologia da imagem é um cansaço da própria linguagem com que trabalha. Nas mãos de um diretor tão tecnicamente habilidoso como ele, sua intenção crítica desaparece sob sua pirotecnia.
Em um filme como ``Assassinos por Natureza", a grande violência não vem do que possa, a princípio, se acreditar como mais chocante: o assassinato brutal ou o desejo de romper qualquer ligação com a humanidade.
O que há de mais violento é a idéia de que só se pode criar uma crítica através de uma aporia: o uso da imagem enlouquecida para se contrapor à banalização da própria imagem. Mas, ainda assim, é um filme supreendente em sua opção pela radicalização. Imagem e movimento.

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