São Paulo, quarta-feira, 19 de outubro de 1994
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Fantasma também vai à escola

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – A investigação sobre bandalheira fez com que o Brasil conhecesse uma imensa modalidade de fantasmas, vivíssimos quando se trata de tungar os cofres públicos: conta fantasma, eleitor fantasma, empresa fantasma, funcionário fantasma, entidade social fantasma, paciente fantasma. Um novo tipo começa a ser descoberto agora e mostra até onde vai a esculhambação social: o estudante fantasma.
De todos os tipos de bandalheiras, nenhuma delas irrita mais do que quando atinge diretamente os mais pobres. O Brasil é pródigo em desvio de merenda escolar, remédios e verbas assistenciais –um desvio, muitas vezes, vinculado a esquemas políticos e eleitorais.
O Ministério da Educação suspeitou que havia algo cheirando mal nas bolsas de estudos que concede a alunos de primeiro e segundo graus em escolas privadas. A verba é extraída do salário-educação, pago pelas empresas.
Numa primeira fase, mandou investigar 200 escolas no Rio: já descobriu nada menos que 9.000 alunos fantasmas, alimentados com dinheiro público. A escola mandava a lista com nomes, o Ministério da Educação pagava sem saber que, na realidade, sustentava uma fraude.
O problema, aqui, nem é apenas o dinheiro. É o símbolo. No momento em que escolas praticam a fraude rotineiramente, dilapidando cofres públicos, a própria idéia da educação sai abalada. Educação e ética são elementos inseparáveis.
O Brasil teve de passar por uma gigantesca devastação moral até produzir escolas que ensinam a fraudar.
PS – Esse detalhe apenas reforça um fato: as verbas sociais no Brasil, especialmente da educação, não são gigantescas. Mas, segundo indicam relatórios da Unesco, Unicef, Banco Mundial e Organização Mundial de Saúde, nações conseguiram alcançar patamares mais altos de saúde e educação com gastos semelhantes aos do Brasil. Uma das questões centrais é a união calamitosa entre o desperdício, a incompetência e a roubalheira.

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