São Paulo, sábado, 22 de outubro de 1994
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Fiscalização e corrupção

As recentes ações da Prefeitura de São Paulo, interditando mais de uma dezena de salas de cinema e probindo a comercialização de diversos alimentos, chamam a atenção para mais uma das funções públicas que foi profunda e perversamente afetada pelas distorções que maculam o setor estatal brasileiro.
É de fato indiscutível que ao Estado cumpre zelar pela vida e bem-estar dos cidadãos, regulando e fiscalizando áreas que vão da qualidade dos alimentos à segurança das edificações. No entanto, assim como ocorre em diversas outras esferas, também nesta o desvirtuamento da estrutura e funcionamento interno do Estado brasileiro fizeram com que seu desempenho ficasse longe do desejável. No caso, esse desvirtuamento traduziu-se em regras às vezes excessivamente vagas, às vezes excessivamente detalhistas, e numa fiscalização frequentemente arbitrária e corrupta –isso quando não inexistente.
É de se notar, por exemplo, que a pirotecnia publicitária da atual cruzada da prefeitura paulistana não significa um desempenho adequado na área. Pelo contrário. Ao iniciar-se apenas depois de um cinema da cidade pegar fogo, só faz destacar a ausência prévia (há quanto tempo?) de uma atuação sistemática nesse sentido.
Na prática desse setor do poder público, as deficiências da regulamentação, os baixos salários dos fiscais, seus poderes quase imperiais e a disseminação da cultura da corrupção ameaçam mesmo transformar o interesse da sociedade numa preocupação menor.
O cancro é fundo e seu combate passa sem dúvida por uma reforma ampla do Estado. Passa, por exemplo, por regras mais claras e transparentes. Pela possibilidade de enxugar o funcionalismo e assim pagar decentemente aos servidores efetivamente essenciais. Pela moralização da atividade pública, que exige exemplo dos superiores, rigor na investigação de irregularidades e punições duras contra a corrupção. Não são evidentemente desafios fáceis, mas têm de ser enfrentados algum dia, e com coragem.

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