São Paulo, domingo, 23 de outubro de 1994
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Escolas aumentam e indexam mensalidades

VERA BUENO DE AZEVEDO
DA REPORTAGEM LOCAL

As despesas com escolas particulares vão ser um fator a mais de pressão sobre a taxa de inflação de dezembro.
Para o próximo ano, alguns estabelecimentos já estão reindexando as mensalidades, contrariando a medida provisória do Real e o espírito da estabilização econômica.
Novembro é, tradicionalmente, o mês no qual as escolas exigem que sejam feitas as ``reservas de vagas" para o ano seguinte. Para garantir sua permanência no estabelecimento, o aluno paga uma taxa que varia de 50% da mensalidade vigente no mês até 100% do valor ``previsto" para janeiro de 95.
Embora, pela legislação, as escolas devam descontar esse valor da mensalidade de janeiro, na prática não é isso que acontece. Elas não devolvem o dinheiro, considerado uma ``13ª mensalidade".
Esse ``gasto extra" vai se refletir na inflação de dezembro. ``O peso das despesas com escola nos índices hoje é muito alto", diz José Maurício Soares, coordenador do ICV (Índice de Custo de Vida) do Dieese.
No ICV, os gastos com escolas representam, em média, 12,7% do orçamento de famílias paulistanas com renda mensal entre um e 30 salários mínimos (público pesquisado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos).
No IPC (Índice de Preços ao Consumidor) da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), o peso é de 3,036%, diz o coordenador Heron do Carmo.
Já no IPC-r, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), indexador de salários, o peso das despesas com educação é de 0,86%.
Se todas as escolas do Brasil aumentassem suas mensalidades em 55%, por exemplo, o IPC-r já estaria em 0,48%, apenas por conta desse índice. O que, obviamente, não deve acontecer.
Mas a pressão das despesas com escolas sobre a inflação não se limita ao mês de dezembro. Algumas já estão fixando novos valores para as mensalidades de janeiro, com reajustes que ultrapassam 50%, em descumprimento à medida provisória 651/94, segundo a qual os valores devem ficar congelados até março de 95.
Além disso, outras escolas prevêem reindexação das mensalidades em 95 e até mesmo ``gatilho", se a inflação, medida pelo IPC-r, chegar a 10%.
Essas exigências constam de contratos que devem ser assinados pelos pais ou alunos para que o estabelecimento efetive as matrículas para o próximo ano.
O Colégio Nossa Senhora de Lourdes, por exemplo, já fixou, em contrato, novos valores para as mensalidades de janeiro de 95, diz Marta Marcondes, diretora da Aipa (Associação Intermunicipal de Pais e Alunos de São Paulo).
Segundo ela, a escola, que fica em São Paulo, alterou os valores cobrados na pré-escola de R$ 55,80 para R$ 87,00 (alta de 56%); da 1ª à 4ª séries, de R$ 51,00 para R$ 81,00 (+59%); e da 7ª série, de R$ 55,00 para R$ 91,50 (+66%).
Já o contrato da Domus Sapientiae, também de São Paulo, embora mantenha para janeiro o valor das mensalidades cobradas desde março passado, estabelece que os valores do próximo ano serão reajustados sempre que o IPC-r acumulado (desde este mês de outubro) chegar a 10% (ver fac símile).
Ainda segundo o contrato da escola, a mensalidade de março será reajustada de acordo com o índice de aumento salarial dos professores, que têm no mês a sua data-base.
Ocorre que, pela lei 8.170, que estabelece as regras para os aumentos das mensalidades escolares, apenas 70% desse índice poderia ser repassado aos alunos, já que as despesas com professores não representam 100% dos gastos dos estabelecimentos.
Mas a realidade é que, desde o Plano Cruzado, as escolas vêm sistematicamente desrespeitando as leis, sem sofrer qualquer punição.
Segundo Marta Marcondes, isso ocorre porque não existe um órgão do governo que fiscalize os estabelecimentos de ensino privados.
``A Constituição estabelece que a educação pode ser exercida pela iniciativa privada. Entretanto, determina também que essa prestação de serviço é uma obrigação do Estado, permitindo a `concessão' da atividade à iniciativa privada", diz ela.
Por isso, Marta acredita que o governo tem a ``obrigação de fiscalizar as escolas. Enquanto isso não ocorrer, os abusos e a desobediência civil continuarão a acontecer impunemente", afirma.

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