São Paulo, domingo, 23 de outubro de 1994
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A hora é agora

``Quem sabe faz a hora, não espera acontecer."
Geraldo Vandré

A ampla maioria dos brasileiros (62%) espera do presidente eleito, Fernando Henrique Cardoso, um governo ótimo ou bom, segundo pesquisa Datafolha publicada na edição de hoje. Apenas 8% acham que a sua gestão à frente do Planalto será ruim ou péssima. FHC tem, portanto, um sólido apoio da população que, aliás, o elegeu para ocupar o posto máximo da nação já no primeiro turno, fato pouco comum nesse tipo de regime eleitoral.
É até natural que as pessoas depositem suas esperanças no próximo governo. A expectativa em relação à gestão Collor também era alta: 71% esperavam uma administração ótima ou boa, contra 4% de ruim ou péssimo. Mas Collor elegeu-se fazendo oposição ao governante da época, José Sarney. No final da gestão Sarney, os índices de inflação beiravam os escandalosos 80% ao mês, espalhando os perversos efeitos sociais que a instabilidade monetária é capaz de trazer.
FHC, diferentemente de Collor, não foi eleito fazendo oposição ao governo, mas sim na esteira de seu plano de estabilização econômica, que também foi capaz de emprestar credibilidade à antes desprestigiada gestão Itamar Franco. Hoje, 40% consideram a gestão de Itamar ótima ou boa, contra 11% em novembro de 93. Para 46% dos brasileiros, seu governo é hoje regular; apenas 9% o consideram ruim ou péssimo.
E se as expectativas positivas em relação ao governo Collor cresciam na mesma proporção em que a inflação disparava, esse mecanismo pode funcionar em sentido inverso em relação a FHC. Nada garante que um desgaste do governo Itamar venha a fazer com que as pessoas passem a confiar mais na gestão de FHC. Afinal, espera-se um governo que dê continuidade à única grande obra realizada durante a gestão Itamar, o Plano Real.
Nesse sentido, pode-se supor que FHC, recém-ungido pelas urnas, viva hoje o auge de sua popularidade. Tem um capital político que, daqui para a frente, só tende a ser desgastado, pelo menos no curto prazo. O próprio anúncio de medidas restritivas ao consumo, que não foi captado pela pesquisa, já pode ter tirado alguns pontos de FHC.
O próximo presidente corre, portanto, contra o relógio. É agora que ele tem mais força para tentar negociar as reformas estruturais que darão sustentação ao plano.
Que ninguém se iluda. Enquanto não forem realizadas profundas reformas no Estado brasileiro, não haverá estabilidade monetária duradoura. É preciso reformar e com urgência a falida Previdência Social e o irracional sistema de arrecadação de impostos e reequacionar o próprio Estado brasileiro, que hoje se embrenha em funções que não são de sua alçada afogando fortunas em estatais dominadas pela burocracia e pelo desperdício.
Essas mudanças não são fáceis de realizar. Há grandes interesses políticos e corporativos envolvidos. FHC terá de empenhar todo o capital político de que dispõe para vencê-los. A hora de agir é agora.

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