São Paulo, domingo, 6 de novembro de 1994
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Uma cineasta nas preliminares

Por Heloisa Helvecia Fotos Ana Ottoni
Estrela dos antológicos "Lúcio Flávio", "Idade da Terra" e "Como Era Gostoso Meu Francês", Ana Maria Magalhães volta às telas como diretora de história erótica. É só aquecimento, enquanto prepara seu primeiro longa, sobre a vida de Odete Lara
A atriz sofisticada anda sumida. A cineasta simples por auto-definição está nas telas paulistanas, assinando um episódio de "Erotique", co-produção internacional que mostra o erotismo do ponto de vista da mulher. Ana Maria Magalhães avisa que não tem "pretensão nenhuma como diretora". E nenhuma insegurança também: depois deste "médio", ela roda o primeiro longa-metragem, orçado em US$ 830 mil.
A diretora simples entrou por encomenda no complicado terreno da sexualidade: um grupo independente de Los Angeles resolveu reunir "olhares femininos" de vários países e deu o mote. Americana, brasileira e chinesa produziram seus episódios sobre sexo por telefone, descoberta da sexualidade e resgate da tradição chinesa através de posições. Coube ao grupo cuidar para que as histórias tivessam igual padrão de qualidade.
Antes do trabalho, Ana achava bobagem essa coisa de olhar feminino. Filmando, mudou de idéia. "O homem, quando filma erotismo, põe a mulher de objeto e nunca se coloca. Mas mulher se expõe. Todos os episódios têm certa suavidade e esse não-distanciamento. Não é revanche, só outra visão, inédita."
Seu "Chamada Final" é adaptação para lá de livre do conto "A Língua do P", de Clarice Lispector –outra que entrou no tema da carne para atender encomenda de editor. A personagem central é uma professora ingênua do interior de Minas. Está num trem. Dois homens entram na cabine. No conto, eles combinam na língua do P um ataque à professora. Ela entende a língua do P. Nervosa, se finge de prostituta. Funciona. Eles perdem a vontade de estuprar. Ela sente vontade de ser estuprada.
"Fiz uma adaptação livre porque no conto, o erotismo era muito mais sofisticado e interiorizado e também a língua do p é impossível em inglês", explica a diretora. Da história, adaptada por Eloí Calage, ficou a idéia da recatada que, a partir de uma ameaça de violência, se percebe uma perversa –"o que no fim é saudável, porque é a descoberta da própria sexualidade".
Dos três, o episódio brasileiro é o mais romântico. "Delicado", diz Ana Maria, invocando Júlio Cortázar: "Erotismo é inconcebível sem delicadeza".

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