São Paulo, segunda-feira, 7 de novembro de 1994
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'Novela atenta contra consciência de raça' ;Audiência

ARMANDO ANTENORE
DA REPORTAGEM LOCAL

'Novela atenta contra consciência de raça'
Organizações e telespectadores negros condenam atitude 'permanentemente servil' de personagem que sofreu racismo
O Geledés/SOS Racismo não é a única organização que está protestando contra "Pátria Minha". Pelo menos outros três grupos discordam da maneira como a novela retrata os conflitos raciais no país.
Nenhum dos três, porém, pretende contestar a Globo judicialmente. Preferem exercer pressão mandando cartas à emissora.
Duas organizações são paulistas: o Núcleo de Consciência Negra, que funciona na Universidade de São Paulo, e a Pastoral do Negro, que atua em Santa Bárbara d'Oeste (interior do Estado).
O terceiro grupo, o Instituto de Pesquisas das Culturas Negras, é do Rio.
Como o Geledés, consideram que o personagem Kennedy reagiu indignamente às agressões do patrão e não demonstrou "consciência de raça".
A prova: quando relatou à avó os insultos que acabara de sofrer, o jardineiro disse apenas que Raul o chamara de ladrão. Em nenhum momento, fez menção às expressões pejorativas que o empresário usou para se referir à raça negra.
Os três grupos repudiam, ainda, a "postura permanentemente servil" de Kennedy –que, mesmo diante da fúria de Pelegrini, continuou chamando-o de "senhor".
O diálogo entre Raul e o jardineiro também despertou a indignação de telespectadores que não militam em organizações de negros.
"Sou uma cidadã comum. Nunca participei de movimentos políticos ou coisas do gênero. Mas quando vi aquilo pela televisão me deu vontade de sair às ruas protestando. Fiquei chocada", afirma a representante de vendas Anizelina Salustio dos Santos.
Paulista, negra, 35 anos, Anizelina procurou a reportagem da Folha na sexta-feira para "desabafar". O advogado Eduardo Santos, 65, também negro, fez o mesmo: "É sempre assim. Quando a televisão resolve discutir preconceito racial, só fala da comunidade negra. Sabe por que não falam dos judeus? Porque os judeus têm o poder econômico nas mãos."
Santos pensa em entrar com uma ação popular contra a Globo. Deverá invocar o artigo 20 da lei federal 7716/89, que define como crime "praticar, induzir ou incitar, pelos meios de comunicação, o preconceito de raça, cor, religião, etnia ou procedência nacional."
Entre a comunidade negra há, no entanto, vozes dissonantes. "Em um único capítulo de novela, a Globo conseguiu o que estamos tentando há décadas: denunciar o preconceito racial no Brasil e a truculência dos racistas", contrapõe Adomair Ogunbiyi, coordenador do Movimento Negro de São Bernardo do Campo (SP).
Audiência
O confronto entre Pelegrini e Kennedy não fez aumentar nem diminuir o público de "Pátria Minha".
Quarta e quinta-feira, dias em que a Globo exibiu o diálogo dos dois personagens, a novela teve audiência média de 44 pontos (1,7 milhão de domicílios) na Grande São Paulo. Habitualmente, a trama registra médias entre 43 e 55 pontos, de acordo com o Ibope.

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