São Paulo, terça-feira, 8 de novembro de 1994
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Armistício e profissionalização

LUIZ CAVERSAN

RIO DE JANEIRO – Deve pegar a moda lançada ontem por traficantes de uma favela do Rio, que resolveram "depor" suas armas. Deve pegar porque é uma excelente saída para os centenas de envolvidos com o crime organizado no Rio que não têm ficha na polícia e querem mais é sair de cena.
Isto não quer dizer que eles necessariamente vão abandonar os negócios e mudar de cidade, como alegam ter feito os dois criminosos da zona norte.
Mas o mais provável que aconteça é a profissionalização do tráfico.
Certa vez, um fornecedor de drogas da zona sul de São Paulo disse que achava o cúmulo do amadorismo seus colegas cariocas posarem de capuz e arma em punho, enfrentarem a polícia e terem como hobby coleções de AR-15.
Para esse "profissional" de São Paulo, nada a ver com tráfico verdadeiramente organizado.
Como bem sabe a polícia paulista, os traficantes locais dispensam fuzis e aparatos afins. Trabalham com discrição total, atendem pedidos por telefone, bip ou telemensagem.
Ninguém precisa subir morro. A entrega pode ser feita por motoqueiros, no local e na hora indicados pelo consumidor. Só falta a mercadoria vir com as especificações na embalagem e o telefone do Procon...
É bastante provável que os pés-de-chinelo do tráfico carioca sejam obrigados mudar de ramo, ainda que temporariamente. Mas os verdadeiros donos do tráfico não vão abandonar assim facilmente atividade tão lucrativa.
Portanto a louvável iniciativa de combate ao tráfico vinculado ao combate às armas ilegais deve atingir o comércio apenas na ponta do varejo.
O atacado está bem longe da favela, não ostenta fuzil algum e vai, ora se vai, sofisticar sua maneira de atuação para se adaptar aos novos tempos.
Porque, até agora, absolutamente nada foi feito no sentido de se identificar e combater de forma eficaz os chamados "peixes gordos" do tráfico no Rio.

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