São Paulo, terça-feira, 8 de novembro de 1994
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Uma nova polícia

JOÃO BENEDITO DE AZEVEDO MARQUES

O aumento da criminalidade violenta, o crescimento do crime organizado e do tráfico de entorpecentes são manifestações preocupantes, principalmente nas grandes cidades brasileiras, como Rio e São Paulo.
As causas são complexas, pois vão desde fatores econômicos e sociais até a impotência e incompetência da polícia em responder ao desafio do crime dando segurança ao cidadão.
Para a população, a polícia existe para garantir a ordem e combater o crime e, à medida que cresce a criminalidade diminui a confiança do cidadão no policial, cuja imagem muitas vezes é associada à corrupção e à violência.
Os episódios da Candelária, Vigário Geral e Carandiru são sintomas da degeneração do aparelho policial.
Se a polícia não funciona eficazmente e os defeitos se acumulam ao fim de cada governo, é necessário adotar-se uma nova filosofia de segurança pública que se traduza numa nova polícia: presente, eficaz, não-violenta, não-corrupta e, acima de tudo, legalista.
A universidade precisa participar intensamente desse processo de transformação e criação de uma nova filosofia de segurança pública.
Centremos a nossa análise, neste momento, nas polícias estaduais que independentemente de mudanças estruturais e legislativas indispensáveis no combate à criminalidade necessitam de profundas modificações para darem um mínimo de segurança ao povo.
A segurança pública, como acentua a Constituição Federal (artigo 144), é dever do Estado e direito do cidadão. O cidadão, que paga seus impostos, tem o direito de exigir uma polícia moderna e eficiente e que lhe garanta o seu direito constitucional à segurança pública.
O Estado federado que não fornece segurança está violando a norma constitucional e pode ser objeto de intervenção federal.
No país há duas instituições policiais representadas pela Polícia Civil, incumbida da polícia investigatória, e a Polícia Militar, responsável pelo policiamento ostensivo. Na verdade, os campos não estão absolutamente separados e as ações da PM e da PC se interpenetram, quando não se confundem e se chocam.
A divisão da polícia em dois ramos é antiga e constitucional. Em termos de resultado para a população, não se pode dizer que seja positiva. As polícias Civil e Militar precisam passar por um amplo processo de reformulação, sem perda da hierarquia e disciplina.
Todo o trabalho policial deveria ser centrado na investigação científica e para isso é indispensável aparelhar-se e prestigiar-se devidamente a polícia técnica. O policial deve ter preparo compatível com uma nova política de segurança pública baseada na legalidade e na eficiência. As ações policiais precisam de planejamento, e o respeito à lei e à Constituição deve ser transmitido como se fosse um dogma para o policial.
O aquartelamento deve ser substituído pelo policial na rua, retirando-se a Polícia Militar de funções indevidas ou desnecessárias. As rondas comuns de ambas as polícias devem ser permanentes, integradas e baseadas nos distritos policiais para que inibam o crime.
As corregedorias das polícias precisam ser de fácil acesso ao cidadão e devem ser fortalecidas. O policial deve ter um salário digno, que permita a sua subsistência pessoal e de sua família, e não um salário de fome.
A comunidade, através de organismos não-governamentais, deve participar do planejamento da ação policial, através da criação de um Conselho Estadual de Segurança Pública.
O trabalho das guardas municipais precisa ser estimulado e melhor aproveitado, integrando-se o município na política de segurança do Estado.
Enfim, há que se lutar pela criação de uma nova polícia unificada de caráter civil legalista, eficiente, respeitada e não temida pelo povo e que dê segurança ao cidadão, pois o atual modelo está exaurido e falido.

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