São Paulo, domingo, 20 de novembro de 1994
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A vez dos Estados

WINSTON FRITSCH ; GESNER OLIVEIRA

Agora os Estados devem reduzir o peso dos impostos sobre as exportações
WINSTON FRITSCH e GESNER OLIVEIRA
A liberalização das importações e a desregulamentação dos mercados são elementos essenciais da nova estratégia industrial brasileira. Ao submeter as empresas à maior pressão competitiva, essas políticas vêm gerando respostas que têm resultado em ganhos significativos de competitividade, especialmente após a recuperação do nível de atividade.
Entretanto, a exposição da indústria brasileira a um ambiente de maior competição tem revelado distorções que impedem que as empresas, apenas por obra de suas decisões gerenciais, promovam a reestruturação eficiente. A inadequação da estrutura de impostos constitui um dos principais problemas. Em particular, a desoneração das exportações dos tributos indiretos, conforme permitido pelas regras do Gatt, deve, naturalmente, acompanhar o esforço de ajuste da reforma tributária ao objetivo de maior competitividade da indústria.
A taxação indireta sobre as exportações se concentra na esfera estadual. De fato, o ICMS, de responsabilidade dos Estados, recai sobre produtos primários e semi-elaborados, com alíquotas que variam de zero a 13% do valor exportado.
Atento à necessidade de estimular as exportações, o governo federal adotou recentemente uma série de medidas que esgotam aquilo que, no âmbito da União, poderia ser feito de imediato para desonerar os tributos indiretos das vendas externas. Agora chegou a vez dos governos estaduais.
Vale à pena rever o que vem sendo feito na esfera federal:
1) Isenção da Cofins na exportação de bens e serviços
O decreto nº 1.030, de dezembro do ano passado, regulamentou a isenção das exportações da Cofins, gerando desoneração de 2% do faturamento.
2) Concessão de crédito fiscal de PIS e Cofins em insumos destinados à produção para exportação
O presidente assinou no dia 25 de outubro a medida provisória 674, concedendo devolução do PIS e da Cofins referentes à aplicação destes tributos sobre os insumos destinados à produção para exportação. O exportador será beneficiado, portanto, com crédito fiscal equivalente a 2,65% do valor das matérias-primas e produtos intermediários utilizados diretamente na produção para o mercado externo, tipicamente algo entre 1% e 1,5% das exportações.
3) Isenção de PIS sobre exportações de bens primários
A medida provisória 622, de 22 de setembro deste ano, retirou a incidência de PIS/Pasep sobre as vendas externas de produtos primários.
4) Isenção do PIS nas exportações realizadas por trading companies
A mesma MP 622 equipara as vendas às tradings à exportação, permitindo aumentar a competitividade das exportações realizadas através destas empresas.
Ressalte-se, além destas medidas, que a liberalização do comércio promovida pelo governo constitui, igualmente, importante estímulo às exportações. Com efeito, a redução das alíquotas de importação, cuja média caiu de 21% em 1992 para 13% em 1994, barateia a produção e o investimento ao diminuir os preços de insumos e equipamentos, induzindo aumento de produtividade na produção doméstica.
Ainda há muito o que fazer para desgravar completamente as exportações de impostos indiretos, conforme permitem as regras do Gatt e impõe a realidade de um ambiente internacional competitivo. Mas a União foi ao limite em termos de desgravação das exportações.
Antes da urgente reforma constitucional, a extensão da desoneração tributária das exportações para todas as etapas da cadeia produtiva enfrenta dificuldades operacionais insuperáveis no âmbito federal. Seria inviável estimar, por exemplo, com a acuidade necessária para a concessão de crédito fiscal, qual a incidência efetiva de PIS e Cofins em cada etapa do processo produtivo anterior à produção dos insumos usados diretamente na produção para exportações.
Daí a importância da contribuição dos Estados que, ademais, não implicaria custo insuportável. Embora o ICMS sobre as exportações represente parcela importante da arrecadação de ICMS de algumas unidades da Federação (62% no Pará, 30% no Espírito Santo e 12% em Minas Gerais), para a maioria delas não responde por mais de 5% do total arrecadado.
E, mesmo naqueles Estados em que a participação do ICMS sobre as exportações é grande, este montante não representa necessariamente um percentual expressivo da renda disponível do Estado, dada a importância de outras receitas, como as transferências dos Fundos de Participação.
Acrescente-se ainda que, como resultado da retomada do crescimento e da estabilidade, a receita global de ICMS dos Estados cresceu quase 20% em termos reais nos últimos 12 meses.
Tornam-se particularmente oportunas, portanto, ações do Confaz no sentido de desonerar as exportações. Eis algumas das medidas que poderiam ser adotadas imediatamente:
- revisão do Convênio nº 15/91, que considera como semi-elaborados uma série de bens (e, consequentemente, tributando-os na exportação), em desacordo com o disposto na lei complementar nº 65/91;
- alteração do Convênio ICMS nº 66/68, permitindo que bens de capital possam vir a gerar crédito;
- permissão para que materiais consumidos no processo de industrialização, mas que não integram o produto final, venham a gerar crédito de ICMS;
- retirada de restrição de aproveitamento de crédito de ICMS de materiais empregados em produtos industrializados e semi-elaborados exportados;
- eliminação de entraves à recuperação de créditos por parte de empresas exportadoras caracterizadas por ciclos longos de produção;
- retirada das dificuldades de recuperação de créditos acumulados de ICMS por empresas predominantemente exportadoras;
- permissão de aproveitamento de créditos por parte de empresas comerciais exportadoras, quando da aquisição de mercadorias diretamente do comércio, com o fim de exportação.
É evidente que, a exemplo daquilo que ocorre com a União, providências de maior alcance de desoneração das exportações deveriam vir no contexto de uma profunda reforma tributária que dotasse o país de maior capacidade competitiva.
Esta última poderia estabelecer, no espírito da proposta que vem sendo defendida por vários especialistas, um único imposto federal incidente sobre as exportações, assegurando coerência à política nacional de comércio exterior ao protegê-la de incidências tributárias, frequentemente contraditórias, de diferentes esferas governamentais.
A conjuntura exige, porém, ação imediata. Parcela do segmento exportador enfrenta o desafio de adaptar-se a um novo quadro onde, por razões ligadas ao combate da inflação, a taxa de câmbio não se encontra mais indexada. Os ganhos antiinflacionários obtidos com o Plano Real abriram, por sua vez, novas e promissoras oportunidades para a economia brasileira.
A sociedade espera que as autoridades estaduais do Confaz saibam aproveitá-las rapidamente, eliminando, desde já, a irracionalidade da exportação de impostos às custas de empregos e produção nacionais.

WINSTON FRITSCH, 47, é secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e professor licenciado da PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro) e da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

GESNER OLIVEIRA, 38, é secretário-adjunto de Políticas Estruturais da Secretaria de Polícia Econômica do Ministério da Fazenda, doutor em Economia pela Universidade da Califórnia (Bekerley) e professor licenciado da Fundação Getúlio Vargas (SP).

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