São Paulo, domingo, 20 de novembro de 1994
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Caravana a Curitiba tem assaltos e vandalismo

CLAUDIO JULIO TOGNOLLI
DA REPORTAGEM LOCAL

No dia 1º de novembro, os Gaviões da Fiel foram até Curitiba prestigiar o Corinthians. Entre eles estava o repórter da Folha.
A saída da sede da torcida estava marcada para a meia-noite. Pelo menos 500 jovens, entre 15 e 25 ano de idade, chegaram à sede antes das 22h.
Pelo menos 20% deles pediam R$ 1,00 de quem vissem à sua frente. Era para inteirar a passagem de R$ 15,00.
O comboio atrasou três horas. E um dos motivos foi porque ninguém queria embarcar no ônibus de número 13, da empresa de transportes Citytours.
Motivo: uma semana antes, no mesmo ônibus, um torcedor do Palmeiras tinha morrido com um tiro no queixo. Tinha sido no Rio, após Flamengo x Palmeiras.
Os corintianos diziam ter medo do "fantasma do mancha". Mas acabaram embarcando no ônibus. Por absoluta falta de alternativas.
Antes de entrar no ônibus de número 11, o repórter juntou-se a outros três torcedores recém-admitidos. Os rapazes se faziam uma espécie de chamada oral. Perguntavam-se sobre a escalação da equipe e datas históricas do time.
Temiam ser espancados no "batismo". Pode mesmo acontecer, se, na condição de calouros, não souberem dados fundamentais sobre o time.
Rafael, outro novato, foi alertado para não revelar que morava na Lapa (na zona oeste). Para os gaviões, "Lapa não é bairro", é "chiqueiro de porco palmeirense". Rafael disse que "quem mora na Lapa apanha sempre, mesmo sendo corintiano".
Chegou a ser entoado o cântico do batismo, dentro do ônibus. Já eram 2h da manhã do dia 2 de novembro.
Era uma reedição da música "Farofa-fá", do festival da Rede Globo de 1974. "Cheirei um quilo de farinha, só pra dar porrada, só pra dar porrada-dá", cantavam.
Mas o batismo, por sorte, naquele dia, não passou de algumas "bumbas" –nome dado aos socos leves na orelha dos novatos.
Os torcedores passaram toda a noite berrando letras de músicas rap dos Racionais MC. Era impossível dormir. E vez por outra Paulinho, o chefe do ônibus, gritava enfurecido: "Eu já falei que não quero maconha aqui!".
Fomos levantados das poltronas às 7h30 do dia 2 de novembro, quando o ônibus pára num restaurante a 30 km de Curitiba. Era para tomar café. Mas nem precisava.
O desjejum que corria no ônibus, desde as 5h da manhã, era pinga pura, 51, e batida de coco, marca Coquinho. Quem não bebia era chamado de "veado" e "porco" (palmeirense).
No restaurante aconteceu o inevitável: os gaviões invadiram lentamente o lugar. E começaram a saquear tudo. Dando preferência a bolos, caixas inteiras de sorvete e garrafões de vinho, de cinco litros.
O caixa, mirradinho, fez de conta que não viu nada. Ficou o tempo todo cercado por um grupo de negros. Altos e fortes, um autêntico "dream team".
Paulinho, o responsável pelo ônibus da torcida, condenou a prática. Mas só conseguiu restituir ao restaurante um garrafão de vinho furtado. O caixa resolveu chamar a polícia. Mas o ônibus disparou antes que os "tiras" chegassem.
Pouco à frente, fomos revistados, um a um, por um comando da Polícia Rodoviária. Estávamos a apenas 15 km de Curitiba.
Confiscaram de nosso ônibus 11 litros de pinga, que haviam sido furtados do restaurante.
Já em Curitiba, um grupo de 20 gaviões vai ao Passeio Público e ao Shopping. Os curitibanos têm medo e se afastam. No shopping, gritando "'ô, ô, ô, Gaviões é o terror", os seguranças fazem marcação homem a homem.
Depois de uma hora ali dentro, os corintianos resolveram dar uma volta pelo Passeio Público da cidade. Um torcedor do Coritiba, com a camisa do clube, foi cercado. "Vai morrer porque invadiu nosso terreno", disse um gavião.
Outro corintiano observou: "Olha, ele tem um brinquinho de cruzinha, deve ser roqueiro". Ao que Lincoln decretou:"Você só não vai morrer espancado se souber o nome dos cinco primeiros discos do grupo Iron Maiden".
O menino responde e acerta os nomes na primeira tentativa, com a voz trêmula. É libertado, indo embora com a camisa do time intacta.

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