São Paulo, domingo, 20 de novembro de 1994
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A matemática e a música de Simonsen

MARCELO COELHO
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O ex-ministro da Fazenda Mario Henrique Simonsen reúne neste livro as apostilas de um curso sobre metodologia da pesquisa científica, lecionando na Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getúlio Vargas em 1992 e 1993.
Os 15 capítulos do livro revelam facetas do autor até aqui desconhecidas do grande público. Para além de sua óbvia presença nos debates e nas decisões de política econômica, e das frequentes incursões no campo da música clássica e de ópera (colabora como crítico musical na revista "Veja"), Simonsen surge, neste volume, como autor de comentários e exposições densas a respeito de temas como a teoria dos números, a mecânica quântica, o eletromagnetismo de Maxwell.
No primeiro capítulo, o autor faz um balanço da epistemologia científica, avaliando as idéias de Platão, Descartes, Kant e Popper entre outros. Os três capítulos seguintes, mantendo uma perspectiva histórica, tratam das descobertas matemáticas. O primeiro, cuidando dos números irracionais, começa com Pitágoras e termina com as modernas formulações do matemático Dedekind.
Em seguida, é o problema dos conjuntos infinitos de números que passa, dos paradoxos de Zero, a Arquimedes. Leibniz, e à aritmética transfinita de Cantor. A geometria ocupa o capítulo seguinte, mostrando, desde Euclides e Descartes, as progressivas sofisticações do tema, com Mercator e Riemann.
Simonsen dedica também um estudo aos aspectos matemáticos da música, em que, ademais das complexidade do sistema de afinação atualmente em uso, permite-se comentar a "Nona Sinfonia" de Beethoven e o cromatismo wagneriano.
Passa, nos capítulos de 6 a 10, ao mundo da Física. Seguindo sempre uma perspectiva histórica, expõe as teorias de Aristóteles, Copérnico, Galileu, Kepler e Newton no cap. 6.
Outro capítulo dedica-se a "Campos e Vetores", o campo eletromagnético, de Faraday e Maxwell e deste a Einstein, é trabalhado no capítulo 8. A Teoria da Relatividade recebe detalhada exposição no texto seguinte, que dá a conhecer a transformação de Lorentz, a contração de Fitzgerald, o efeito Doppler, os vetores de Minkowski. Niels Bohr, Schroedinger e a mecânica quântica são o tema do capítulo 10.
Nos cinco textos finais, Simonsen dedica-se à teoria econômica. Das idéias de contrato social no século 18 à experiência comunista, temas sociais mais amplos sofrem cerrada análise, que se desdobra em capítulos especialmente dedicados ao liberalismo clássico, a Marx, e à "revolução marginalista", de Walras a Keynes. No último capítulo, Simonsen faz uma análise crítica da moderna teoria das "escolhas racionais", envolvendo teoria dos jogos e o problema da formação de preços.
Não se tratando propriamente de uma coleção de "Ensaios Analíticos", o livro de Mario Henrique Simonsen é sobretudo uma exposição sintética, e ao mesmo tempo panorâmica, de problemas científicos de uma enorme dificuldade. O autor não recua diante desta. Quase todas as páginas do volume estão entremeadas de equações matemáticas, e não se hesita no uso de formulações verbais concisas, como convém a apostilas de curso.
Dirigido a alunos de pós-graduação em Economia, o livro de Simonsen é infelizmente inacessível ao leitor leigo. Familiaridade com matemática avançada, para não dizer a presença de um professor paciente em sala de aula, são imprescindíveis a quem queira aventurar-se pelos problemas e pelas soluções que o livro aborda.
Longe de ser um trabalho de divulgação científica, ou de dar a público exemplos da conhecida mordacidade ou do talento comunicativo do autor, "Ensaios Analíticos" demonstra, sobretudo, a abrangência de seus interesses e o rigor com que se dispõe a comentá-los.

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