São Paulo, terça-feira, 22 de novembro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Esqueçam o que escrevemos

As declarações de autoridades econômicas em favor de uma política de juros elevados ao longo de 95, com o objetivo de consolidar a estabilização, lembram a receita conhecida como "feijão com arroz". É uma abordagem gradualista, colocando em primeiro plano a necessidade de refrear a demanda.
De fato, desde o início do Plano Real verificou-se uma expansão do consumo que se converteu rapidamente em pressão inflacionária. A reversão desse quadro, através do desaquecimento econômico, torna-se assim condição necessária para combater a inflação. Necessária, mas insuficiente. Necessária, mas que não se alcança necessariamente com a elevação dos juros reais.
É da produção acadêmica de alguns membros da atual equipe econômica, por exemplo, a noção de que toda política recessiva é inútil quando a economia se encontra indexada. E o Plano Real, embora tenha promovido ampla desindexação, não levou o processo às últimas consequências. Uma política recessiva, num quadro de indexação mesmo parcial, pode assim trazer o ônus do desemprego sem o bônus da queda na inflação.
Outro diagnóstico quase consensual entre os economistas aponta a alta dos juros como fator de pressão sobre as contas do Estado. Consolidar a estabilização com indexação renitente é algo tão inconsistente quanto buscar o equilíbrio econômico produzindo desequilíbrio maior nas finanças públicas.
Lembre-se ainda que os elevados juros internos têm atraído recursos externos, estimulando a excessiva valorização do real. Anunciar novas altas nos juros traz expectativas de apreciação ainda maior do câmbio.
Há portanto apenas duas hipóteses razoáveis. De um lado, viria o governo, ao lado dos juros elevados, a introduzir medidas que completassem a desindexação, ajustassem as finanças públicas e impedissem a valorização cambial. Nesse caso, juros altos fariam sentido por algum tempo. Mas falta esclarecer que medidas adicionais são essas.
Outra hipótese é desejarem os membros da equipe que se esqueça, também, tudo o que já escreveram sobre a inflação brasileira.

Texto Anterior: Operação Rio
Próximo Texto: Príncipes e miseráveis
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.