São Paulo, quinta-feira, 1 de dezembro de 1994
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Para sexo e política, não precisa ser bom

DAVID DREW ZINGG
EM MIAMI

ATENÇÃO, TODOS OS TURISTAS BRASILEIROS QUE POSSAM ESTAR A CAMINHO DE MIAMI! ISTO É UM ALERTA! PERIGO! EVITEM MIAMI ENTRE 9 E 11 DE DEZEMBRO –RISCO DE VIDA!
Estamos passando por um período de forte atividade política latino-americana na Flórida. Nesta época do ano o Estado normalmente se dedica ao ramo tranquilo da extração de dinheiro dos bolsos de trás dos simpáticos brasileiros e outros visitantes tropicais.
Este ano a cidade de Miami dará uma grande festa para todos os dirigentes dos países das Américas, com a exceção de Fidel Castro. Se você, Joãozinho, é um cara ligado no que rola pelo mundo, percebeu que o Velho Especialista em América Latina Dave está se referindo à Cúpula das Américas, que começa em Miami, na sexta-feira da semana que vem.
A cúpula está sendo anunciada como uma reunião estratégica muito vital para 33 dos "jefes" políticos do continente. Se você realmente quiser contar o número de políticos, parentes de políticos, amigos de políticos e amigos dos amigos de políticos que irão juntos, aproveitando a carona, vai dar um pouquinho mais do que os 33 anunciados.
O Velho Festeiro Dave fez um cálculo preliminar e chegou ao resultado de exatamente 1.748.341 pessoas. É claro que este cálculo não inclui os prestadores de serviços essenciais, como o barbeiro de Carlos Menem e os amigos dele (do barbeiro).
Depois da recente investida congressional brasileira sobre Nova York, liderada pelo incansável estudioso de assuntos internacionais Inocêncio de Oliveira, devo ter esquecido de incluir no cálculo do meu total projetado uns 200 mil políticos de Brasília que vão fazer questão de estar presentes também, para poderem encontrar a resposta à pergunta intrigante: "O que é uma cúpula, afinal?"
A cúpula será uma festa e tanto. Haverá várias festas de arromba, seguidas por jantares realmente chiques. Quando chegar a hora dos charutos (não cubanos) e os presidentes latino-americanos começarem a traçar seus conhaques, o anfitrião, Bill Clinton, vai provavelmente sentir que está acompanhado dos amigões certos. Muitos de seus colegas dirigentes poderão contar suas próprias versões das historinhas Bill-e-Hillary, próprias para após o jantar.
Para começo de conversa, três deles –Clinton, nosso Itamar e o ídolo-de-matinês-que-virou-executivo-chefe, Carlos Menem– devem ter muitas figurinhas a trocar no departamento barbeiros.
Assunto para o papo pós-jantar não vai faltar. Se a conversa se dirigir aos escândalos, como o caso Whitewater que aflige Bill Clinton, alguém poderá trazer à tona as provações a que Menem tem sido submetido –o "Leitegate", o "Swiftgate" e o "Yomagate".
"Gate" é um sufixo usado quando entra em cena qualquer coisa política que tenha cheiro de axila de jogador de futebol depois de uma partida disputada.
Essa reunião de alto nível só vem comprovar o que tio Dave sempre achou: que a arte de governar é como o sexo –não é preciso ser bom nisso para fazer.
Considere o caso de nosso vizinho próximo e muito querido, o presidente "teflon" da Argentina, Carlitos Menem. Em Buenos Aires chamam Menem de "teflon" porque as acusações não grudam nele, como ovo frito não gruda na panela revestida de tefal.
Apesar dos crônicos escândalos de seu governo, apesar de sua queda por Ferraris vermelhíssimas, top models, Xuxas, dançarinas do ventre, viagens caras em aviões a jato e apesar de frequentemente expulsar sua mulher (com quem está casado há 26 anos) da residência presidencial, Menem está mais popular do que nunca.
Descrevendo seu casamento, Menem bem poderia dizer: "Minha mulher e eu fomos felizes por 26 anos. Aí nos conhecemos."
Ele e Zulema Yoma (vocês se lembram do "Yomagate"?) vivem tempestuosamente há décadas. Passaram separados mais da metade de sua vida de casados. Em 1989, quando o Costeletudo candidatou-se à Presidência, encenaram uma reconciliação útil. Uma semana depois de ele ganhar a eleição, Zulema mudou de casa. Ela disse que o fez porque havia "grampos" high-tech na residência presidencial.
Após uma série de, digamos, mal-entendidos, Menem perdeu sua calma presidencial e assinou um decreto que fez do palácio de Olivos a residência legal do Grande Timoneiro da Argentina, e de ninguém mais. Yoma entendeu a dica e mudou-se de casa.
Caso você seja um primo de segundo grau de um senador de Brasília que pretende viajar a Miami na condição de "motorista" oficial, eis alguns dos escândalos que correm pelo gabinete de Menem. Eles darão ótimo assunto para bate-papos num jantar oficial no hotel da delegação argentina.
"Leitegate". Dois assessores próximos de Menem renunciaram quando um juiz investigou acusações de que suas empresas haviam vendido leite contaminado ao governo para ser distribuído a –preste atenção– bebês e mães grávidas.
"Swiftgate". A empresa americana processadora de carne Swift-Armour registrou queixas de que funcionários do governo argentino estavam exigindo –que surpresa!– propinas.
"Yomagate". Provando que outras coisas são mais importantes do que o casamento, a cunhada de Menem, Amira Yoma, e vários outros assessores de Menem renunciaram aos cargos devido a acusações de lavagem internacional de dinheiro.
A suprema ironia da situação de Menem é que ele é muito amado na Pampalândia pela estabilidade que traz a seu país.
Tradução de Clara Allain

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