São Paulo, sexta-feira, 9 de dezembro de 1994
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UM HOMEM TROPICAL

MARISA ADÁN GIL
DA REVISTA DA FOLHA

No dia 22 de novembro, fui à casa de Tom Jobim para uma entrevista. A reportagem em questão seria publicada na Revista da Folha do dia 18 de dezembro.
Tom me recebeu às 11h da manhã. Estava sentado no sofá da sala que lhe serve de estúdio (ampla, com dois pianos de cauda, partituras, CDs, livros, aparelho de som, TV e vídeo). Vestia calça, camisa e jaqueta claras. De perto, parecia mais velho do que em fotos, mas mais jovem do que fariam supor os seus 67 anos. Cumprimentou a mim e à fotógrafa que me acompanhava com apertos de mão.
Começou o papo brincando –com o fato da fotógrafa ter o mesmo nome de sua mulher (Ana) e com o fato de sermos de São Paulo ("meu avô era de São Paulo"). Depois, perguntou: "Mas sobre o que você quer falar mesmo, Marisa?" Um pouquinho de tudo, respondi.
Depois de tomar ali mesmo o café da manhá trazido por uma empregada (uma xícara pequena de café e um pedaço de queijo branco), pediu para que eu sentasse ao seu lado –ele tem o costume de colocar a mão no seu ombro enquanto fala. Cruzou as pernas sobre o sofá, sorriu. "Vamos começar?" Parecia bem e extremamente à vontade.
Durante as duas horas de entrevista, andou pela sala, mudou de lugar várias vezes. Levantava para trocar de óculos (nunca ficava satisfeito com eles) ou para pegar charutos –que fumou o tempo todo, fazendo questão de afirmar que não tragava ("só da boca para fora"). Quando perguntei sobre seus vícios, falou também sobre a bebida. Disse que não tomava mais "aquele uísque e aquela cerveja"–só um "copinho de vinho no almoço".
Falou pouco sobre seus cuidados com a saúde. Disse que se preocupava em comer uma comida sadia e natural, ter contato com ar puro e natureza, "andar um pouquinho". Perguntei se tinha medo de morrer. Respondeu imediatamente: "Tenho." Depois, acrescentou. "Mas não exageradamente."
A viagem a Nova York (da qual havia regressado há uma semana) apareceu de passagem na conversa. Tom deu a entender que não era nada importante, só uns "exames". Mais tarde, no dia 6 de dezembro, entrei em contato com o assessor de imprensa de Tom, Marcos Vinicius dos Santos, 35, e perguntei o motivo da nova viagem aos EUA. Segundo ele, completar os exames. Perguntei a gravidade do seu estado de saúde. "Não se preocupe, não é nada", respondeu.
O tema "saúde" voltou a aparecer no momento das fotos. Era um dia frio e chuvoso no Rio, e Tom reclamou de ter que posar em frente a uma porta aberta. "Está muito frio", disse, voltando para dentro.
Para relaxar (ele detesta câmeras fotográficas, "elas não têm alma"), improvisou um pouco no piano, enquanto fumava e fazia perguntas ("quando é que você vai se mudar aqui para o Rio?"). Despediu-se com um "tchau, querida" e beijos no rosto. Foi almoçar com sua mulher, Ana Beatriz.
Na reportagem para a Revista da Folha, reproduzida nesta página, tal qual seria publicada, ele comentava seus próximos projetos: um disco com Gal Costa, outro com a soprano norte-americana Kathleen Battle, um livro sobre a Mata Atlântica e uma autobiografia em inglês.
Nem todo material gravado foi utilizado pela Revista. Partes que, por motivos de edição, foram excluídas, estão reproduzidas a seguir, sob a forma de perguntas e respostas.
Tom fala sobre sua relação com os jovens e o rock, e diz não estar desapontado por não ter suas músicas tocadas em rádio no Brasil –ele que é um recordista mundial de execuções. Reafirma sua fé em Fernando Henrique Cardoso (a quem apoiou), que acredita ter qualidades para melhorar o país.
Explica porque nunca quis morar nos EUA, apesar de ser mais bem tratado por lá. Diz que não quer saber do que acontece com o seu dinheiro e nunca assina um cheque. E, citando Carlos Drummond de Andrade, comenta a chegada da velhice. "Velhice é boa, mas é uma merda. Não queira ficar não, porque é uma porcaria."

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