São Paulo, segunda-feira, 12 de dezembro de 1994
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Viagem a 2029

JOSIAS DE SOUZA

BRASÍLIA-Já ouviu falar de Ivan Hasslocher? Não? Há 35 anos, em 1959, ele fundou um instituto apontado, quatro anos mais tarde, como biombo para arrecadação de fundos de campanha.
Em 1962, revelou-se que havia despejado dólares sobre as campanhas de oito candidatos a governador, 250 deputados federais e 600 estaduais.
Houve CPI no Congresso. A investigação deu em nada. Em 1964, Hasslocher emigrou para Genebra. Em julho de 93, com 72 anos, disse à revista "Veja", em Londres: "Ganhei muito dinheiro". Planejava trocar o fog londrino pelo bafo morno do Texas.
Hoje, temos na figura de PC um novo Hasslocher. São pessoas incumbidas de estabelecer o elo entre a nata do empresariado e candidatos que, eleitos, possam providenciar favores do Estado.
Entre um e outro houve certo avanço. O ex-caixa de Collor não está em Londres ou no Texas. Ainda não. E arrancou-se do Planalto o beneficiário central de suas estripulias.
Mas não avançamos o suficiente. Após as estarrecedoras revelações da fase pré-impeachment, cá estamos, debatendo a insuficiência de provas para uma condenação exemplar de PC e Collor.
Fomos conduzidos a esse ambiente anticlimático por variadas razões, entre elas a incompetência do Ministério Público. Mas o motivo principal é o mesmo que permitiu o confortável exílio de Hasslocher. A investigação resultou incompleta.
Falta à lista de réus do STF a relação dos corruptores. Falta um elo à corrente. E não foram poucos os contribuintes de PC: Odebrecht, Andrade Gutierrez, Votorantim, OAS, Mercedes, Sharp, White Martins, Credicard...
Diante da oportunidade de exorcizar de vez o fantasma da impunidade, optou-se por dar-lhe apenas um susto. É pouco, convenhamos. Ainda que haja condenação.
Logo teremos outro Hasslocher, outro PC. E agora que o PT entrou para o clube, pode não haver quem se disponha a investigá-los. Passados mais 35 anos, em 2029, alguém perguntará: "PC, que PC?"

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