São Paulo, sexta-feira, 16 de dezembro de 1994
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A Operação Serra

JANIO DE FREITAS

Todo o fisiologismo esperado dos pefelistas, na montagem do governo de Fernando Henrique, aconteceu como previsto –mas praticado por peessedebistas. A vitória do senador eleito José Serra, que marcou a primeira derrota política do presidente eleito, foi, além da culminância de disputas com ferocidade rara na política, o resultado de uma operação sem precedentes para a conquista de um ministério.
A pressão desfechada sobre Fernando Henrique, para entregar a Serra um ministério que venha a representar poder de fato no próximo governo, reuniu grandes empresários, jornalistas e alguns dos que circundam mais de perto o presidente eleito. As tradicionais formas de conquista de um ministério, consistindo em articulação de apoios no meio político ou na indicação-pedido de alguém com prestígio bastante, foram substituídas por uma força de pressão acionada de fora para dentro do núcleo político em que Fernando Henrique vinha definindo suas decisões. A exclusão das intermediações políticas foi de tal monta, que a manobra passou à margem até do PSDB –exceto só o próprio Serra e Sérgio Motta, ponta-de-lança da operação junto a Fernando Henrique.
A operação se organizou sob a cobertura de uma questão doutrinária proveniente de Serra e, portanto, tendo-o desde logo como figura central. Era a tese de que a excessiva adesão do ministro da Fazenda escolhido, Pedro Malan, ao uso de políticas de câmbio, juros e taxas de importação, para vencer a inflação, levaria a retardar muito a retomada do crescimento econômico e pôr em risco vários segmentos da indústria brasileira. A alternativa seria a contenção menos radical da inflação, com rigorosa contenção dos gastos governamentais e estímulos imediatos ao crescimento industrial.
Entende-se por que Fernando Henrique, ao se reunir com industriais há dez dias, já os encontrou articulados em torno da alternativa representada por Serra. Eram os mesmos empresários que até poucos dias antes só tinham aplausos para o Plano Real, com todo o monetarismo que o caracteriza. Estava deslanchada a operação –o que não quer dizer que dela participassem todos os favoráveis à presença de Serra no governo. Dali por diante, foi pressão crescente durante uma semana.
Fernando Henrique e Serra tiveram duas conversas extensas e difíceis. As notícias, longamente "plantadas" por próximos de Fernando Henrique, sobre a ida de Serra para a Educação e, depois, para Indústria e Comércio, já haviam mostrado que os desejos de ambos, um em relação ao outro, não coincidiam desde que se apresentou a necessidadae de montar novo governo. A par desta evidência, o simples enunciado do revestimento doutrinário da operação deixa claro que o seu objetivo era o comando da chamada política econômica, era o lugar de Pedro Malan.
A pressão organizada venceu, mas não de todo. Coordenador do programa de governo de Fernando Henrique, primeiro a se tornar ministro certo e com pasta definida, o bem conceituado professor Paulo Renato Souza foi queimado. Perdeu o Planejamento a que já se dedicava desde o começo de outubro. Mas a Fazenda, embora Fernando Henrique deixando-se vencer, ficou com a sua escolha –até quando, é outro assunto.

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