São Paulo, domingo, 18 de dezembro de 1994
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Revista policial sem forte indício ou suspeita é ilegal

EUNICE NUNES
ESPECIAL PARA FOLHA

A revista pessoal –aquela onde os "suspeitos" ficam de pernas abertas e mãos levantadas contra a parede, e que no Rio de Janeiro está sendo feita "por atacado"– só pode ser feita sem mandado judicial quando houver forte suspeita de que a pessoa tenha cometido ou esteja para cometer um crime.
Portanto, a autoridade policial não pode parar uma pessoa na rua e revistá-la e aos seus pertences sem motivo algum.
É necessário que a revista tenha um fundamento objetivo. Por exemplo, se há um furto num supermercado e a polícia revista as pessoas que estão na área do estabelecimento, há razões objetivas para que a atitude seja tomada.
"É uma situação de flagrância que justifica a busca pessoal", diz Ada Pellegrini Grinover, professora de direito processual penal da Universidade de São Paulo.
A suspeita, segundo a professora, deve ser sempre fundamentada. O advogado Belisário dos Santos Júnior concorda, acrescentando que essa fundamentação exige indícios de prova objetivos.
"Parar a pessoa na rua, encostar na parede e fazer a revista sem fundamento é, no mínimo, abuso de autoridade. Pode configurar prevaricação e até violência arbitrária", afirma Santos Júnior.
Se não houver nenhuma razão para a busca, a pessoa pode recusar-se a ser revistada. "Provavelmente será levada pela polícia por crime de desacato à autoridade, mas deve chamar um advogado e abrir processo por abuso de autoridade.", diz Ada Grinover.
Para ela, ninguém é obrigado a entregar bolsa ou pasta para ser revistada. A pessoa pode mostrar o que tem dentro ou exigir a presença de testemunhas para não ficar sob o arbítrio do revistador.
Santos Júnior ressalva, no entanto, que há operações com objetivo determinado (batida para apreensão de entorpecentes, por exemplo), sob o controle de oficiais superiores, onde é possível a revista sem mandado judicial.
Em jogos de futebol ou grandes shows de rock, por exemplo, a revista é permitida por ser um instrumento de prevenção e controle (para evitar a entrada de armas, objetos perigosos e drogas).
Em viagens internacionais, a revista alfandegária também é uma atividade de controle. Mas nem por isso é permitido, sem haver fundada suspeita, submeter a pessoa a situação constrangedora, como mandá-la tirar a roupa e fazê-la esperar horas pela liberação.
"Neste caso, a pessoa pode pedir indenização por danos morais", afirma Ada Grinover.
O essencial é que a busca sempre preserve a dignidade da pessoa, sem humilhar ou constranger.
"A lei procura afastar o vexame, a situação degradante. É por isso que mulher só pode ser revistada por mulher. É constrangedor ser revistada por um homem", diz José Roberto Batochio, presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Por analogia, afirma Ada Grinover, homem só deve ser revistado por homem. "Até por uma questão de eficácia, pois provavelmente a mulher não fará uma revista minuciosa no homem".
Para Santos Júnior, a revista "por atacado", como ocorre atualmente no Rio, é ilegal. "Lá todos são culpados até prova em contrário. Subverteram o princípio constitucional da presunção de inocência", diz.

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