São Paulo, domingo, 18 de dezembro de 1994
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UE é importante alvo diplomático

JORIO DAUSTER
ESPECIAL PARA A FOLHA

Durante as primeiras décadas da construção européia, o relacionamento do Brasil e do restante da América Latina com as instituições criadas pelo Tratado de Roma (1957) foram escassas e até mesmo conflitivas. Contribuíram para isso as preferências comerciais concedidas pela então Comunidade Econômica Européia e suas ex-colônias e a Política Agrícola Comum, ambas vistas como séria ameaça a nossas exportações de produtos primários.
Mais tarde, a predominância de regimes autoritários em nosso continente e os estragos causados pela crise da dívida serviram para nos colocar ainda mais à margem dos interesses europeus.
Tudo isso começou a mudar a partir de meados da década de 80, num processo que desde então só fez se acelerar. Do lado latino-americano, a redemocratização e as reformas estruturais gradualmente restauraram nossa credibilidade como parceiros políticos e econômicos; do lado europeu, a admissão de Portugal e Espanha como Estados-membros garantiu uma maior sensibilidade para com o potencial dos vínculos entre dois continentes que compartem os mesmos valores civilizacionais.
A criação do Grupo do Rio concorreu para esse estreitamento, na medida em que ofereceu aos Doze um interlocutor válido, capaz de exprimir posições coletivas da América Latina sobre os principais temas de interesse mútuo. Estabeleceu-se, assim, um diálogo político institucionalizado entre as duas regiões em cujo âmbito já se realizaram quatro reuniões a nível ministerial, a última das quais na cidade de São Paulo, em abril do corrente ano. Além disso, desde 1982 passaram a se realizar encontros anuais entre altos funcionários responsáveis pelo comércio, permitindo um franco debate dos problemas que afetam o intercâmbio inter-regional.
Ainda mais recentemente, com base numa cooperação iniciada pouco após a conclusão do Tratado de Assunção, o Mercosul e a União Européia passaram a buscar formas de aprofundar seus relacionamentos. O audacioso objetivo estratégico, confirmado em novembro último durante a visita dos chanceleres do Mercosul a Bruxelas, consiste em estabelecer-se uma associação inter-regional mediante a criação de uma zona de livre comércio cujo PIB conjunto será superior ao do próprio Nafta.
Numa primeira etapa, já no próximo ano o Mercosul e a UE (União Européia) deverão assinar um Acordo-Quadro de Cooperação Econômica e Comercial, pelo qual, além de um diálogo político mais intenso, estaremos nos beneficiando da experiência européia em matéria de consolidação dos instrumentos comunitários e poderemos contar com a participação dos Quinze (agora com a presença adicional de Áustria, Finlândia e Suécia) nos grandes projetos de infra-estrutura dos Quatro.
Ademais do relacionamento mantido através do Grupo do Rio e do Mercosul, onde obviamente o Brasil ocupa posição de relevo, desenvolvemos úteis programas de cooperação com base no acordo de "terceira geração" por nós firmado com a UE em 1982. Contam-se aí numerosas iniciativas no domínio científico-tecnológico, na promoção do intercâmbio comercial e dos investimentos, na área ambiental (com destaque para o Programa Piloto de Conservação de Florestas Tropicais) e, proximamente, no campo social.
Vê-se, assim, que a UE está no centro do fazer diplomático brasileiro –posição perfeitamente compreensível quando se levam em conta as afinidades culturais que nos unem historicamente, mas também o reconhecimento de que aqui temos o maior mercado para nossas exportações e a maior fonte de investimentos diretos.
Não há dúvida de que as sementes plantadas pelo Brasil na Europa nos últimos anos, seja ao nível bilateral, seja como integrante do Grupo do Rio e do Mercosul, permitem prever uma boa colheita política e econômica no futuro próximo.

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