São Paulo, domingo, 18 de dezembro de 1994
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MIL E UMA MORAES

Mais que um aposto imprescritível, com o qual ela já se acostumou ("Esta aqui é Susana, filha de Vinicius de Moraes", apresentam), o poeta é a primeira referência cinematográfica da cineasta. Em 1946, Vinicius foi enviado para Los Angeles como vice-cônsul. Dos cinco anos que ele, sua mulher Tati e Susana ficaram na Califórnia, dois foram gastos só em Hollywood.
Como escrevia críticas para publicações brasileiras, Vinicius era convidado às pré-estréias da capital do cinema. E em algumas levava a primogênita. "Uma das poucas sensações de paixão total, de maior adrenalina por que passei foi conhecer o ator norte-americano Montgomery Clift, meu ídolo", lembra ela. "Tinha dez anos e fiquei paralisada, sem respiração".
Dessa época, enquanto seu pai criava amizade com gente como Orson Welles e Louis Armstrong, Susana não esquece o dia em que assistiu "O Crepúsculo dos Deuses", mesmo sem ter idade. "Era amiga da filha do porteiro de um cinema em Los Angeles, ele liberou", diz. "Vem daí minha condição atual de, mais que cineasta, ser fã de filmes."
Susana Moraes só estudou "até o clássico" e debutou tardiamente na direção de um longa, mas sua formação informal na área existe de longa data. Já no Rio, com 11 anos, passava seu tempo "entre a praia e o cinema". Para negar a erudição dos pais –sua mãe também escrevia críticas–, emendava quatro sessões nos leves musicais do Cine Paissandu, no Rio.
Aos 19, casou-se com um amigo de Vinicius, o também diplomata Rodolfo Souza Dantas, com quem tem um filho (único) de 33 anos, e foi morar em Paris. "Hoje, somos grandes amigos", diz. Na capital francesa, tomou contato com a emergente "nouvelle vague". "Quando assisti 'O Acossado', de Godard, foi um tapa", lembra. "Fiquei três dias pasma."
Na volta ao Brasil, com a tal idéia (fixa) na cabeça, arregaçou as mangas e resolveu fazer cinema. Foi atriz dos filmes "Cuidado Madame", de Julio Bressane, "Pedro Diabo Ama Rosa Meia-Noite" e "Pecado Mortal", de Miguel Faria Jr., e "Capitão Bandeira contra o Dr. Moura Brasil", de Antonio Calmon, no início dos anos 70. Musa esclarecida dos cineastas, suas pernas competiam com suas idéias em sucesso.
Embora nem coloque em sua filmografia oficial, atuou ainda num experimento norte-americano chamado "Open The Door and See All The People", do final dos anos 60. Sua estréia por trás das telas, no entanto, se deu com "Matei por Amor", em 1974, de Faria Jr., em que fez assistência de direção. O espectador atento encontra elementos de todas estas obras no recente "Mil e Uma" (leia quadro ao lado). "Sou superinfluenciável, graças a Deus", afirma.
Em setembro deste ano, o jornal francês "Libération" a classificou de "herdeira cultural de Glauber Rocha" em crítica bastante positiva. A ocasião era a exibição de "Mil e Uma" no Festival de Vezeza. "Na verdade, trata-se de um lugar-comum", desdenha. "Todos os cineastas brasileiros atuais somos herdeiros do marco que foi Glauber". Mesmo assim achou "o máximo" o reconhecimento europeu.

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