São Paulo, terça-feira, 20 de dezembro de 1994
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Estratégia e desinformação

LUIZ CAVERSAN

RIO DE JANEIRO – A audaciosa ação de criminosos no domingo à noite –encapuzados, invadiram uma delegacia e mataram duas pessoas– deve servir de motivo de reflexão quanto aos equívocos da via escolhida para combater a criminalidade no Rio.
Essa ação dos criminosos –assim como a retomada dos pontos de venda de drogas nos morros e a não-diminuição dos homicídios na cidade– são indicativos de que a rotina da marginalidade estabelecida há anos já absorve a fortuita ação dos militares.
Vale aqui lembrar, mais uma vez, o temor revelado à Folha por oficiais de alta patente do Exército dois meses antes do início da operação. Os dois oficiais que convivem com as decisões estratégicas daquela força armada buscaram no Vietnã o exemplo negativo de envolvimento das tropas militares com situações imprevisíveis e complicadas para argumentar contra a ação direta de soldados nos morros.
Para eles, ao assumir papel de polícia, os soldados iriam enveredar por um terreno "pantanoso" onde seria fácil de entrar e difícil de sair com resultados satisfatórios.
Pela ousadia dos criminosos, parece que eles já se estão se acostumando com a presença verde-oliva. Como as ações militares realizadas até agora não conseguiram desbaratar as ramificações do tráfico de drogas e armas na cidade, o poder paralelo mostra sua face mais evidente, que é a da violência.
Ou será que não? Ou será que a operação vem conseguindo um sistemático e persistente efeito destruidor contra o tráfico e a criminalidade em geral, mas os militares estão "escondendo o ouro"? Pode ser, porque tudo o que militares fazem é meio secreto, sigiloso.
Essa ilação é legítima, uma vez que até agora, há quase dois meses do início das operações, não se fez ainda um balanço dos êxitos alcançados. Quantos bandidos presos, quanta droga apreendida, quantas armas, quantos inquéritos, quanto, efetivamente, foi resgatado da cidadania perdida nas favelas? A opinião pública desconhece isso tudo.
A dúvida que fica é a seguinte: esses dados são mantidos em segredo para resguardar o sigilo das operações ou porque seriam inexpressivos demais para toda a expectativa que se formou até agora? É esperar para ver.

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