São Paulo, quinta-feira, 29 de dezembro de 1994
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Pouca pena

A sociedade brasileira padece de inúmeras anomalias, mas nenhuma é tão ofensiva quanto a recorrente capacidade dos poderosos e ricos de ficar, senão totalmente acima da lei, pelo menos relativamente protegidos. O "crime do colarinho branco" parece até que, por vezes, pode compensar.
Poucos dias depois da absolvição de Collor pelo STF, assiste-se a outro desfecho, do caso Nahas, certamente menos espetacular, mas eivado do mesmo vício de afinal deixar relativamente impunes réus que notoriamente mereceriam tratamento mais severo.
Naji Nahas tornou-se o maior jogador individual das bolsas brasileiras no final dos anos 80. Finalmente, cinco anos e seis meses depois de ter atuado como pivô de um escândalo de enormes proporções, Nahas foi condenado.
A própria demora no julgamento do processo já incomoda. Mais desencaminhada ainda, entretanto, é a pena: Nahas foi condenado a pagar 10% do valor das suas operações canceladas pela Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. Esta, junto com seus administradores, foi absolvida. Nahas continua apto a operar nas Bolsas, enquanto outros 28 condenados, por serem dirigentes de instituições que operavam com o investidor, ficaram inabilitados por cinco anos a exercer o cargo de administradores de instituições financeiras. Terminam assim no papel de PCs, enquanto o operador maior tem as mãos desatadas.
A demora, o desequilíbrio das penas, a inconsistência de condenar operadores de um jogo sujo, mas deixar incólumes aqueles que, por dever profissional, deviam ter evitado tal jogo em primeiro lugar, tudo revela enorme inadequação e ineficiência dos mecanismos de regulamentação e apuração no mercado de capitais brasileiro.
Os anos 90 primam pela globalização financeira. Nesse ambiente, é fundamental assegurar lisura, transparência e agilidade tanto na investigação quanto na punição de irregularidades. Sem dó, com as devidas penas.

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