São Paulo, quarta-feira, 2 de fevereiro de 1994
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Declarações desastradas

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – Gráfico publicado na Folha, edição de domingo, aponta prós e contras das candidaturas à Presidência da República. O levantamento foi isento e, no meu entender, correto.
Todos os candidatos têm suas vantagens e desvantagens –não é delas que pretendo falar. O que me invocou foi o ponto comum a quase todos os candidatos na rubrica do "contra": as declarações desastradas. A direita, ao centro e à esquerda, os candidatos –ao menos nessa fase preliminar– cultivam a tendência de buscar espaços na mídia. Não têm espaço para pesar palavras –daí o desastre de suas declarações.
Seria o caso de os presidenciáveis adotarem a tática do "nada a declarar", muito útil quando se enfrenta a alfândega e mais útil ainda quando se é ministro da Justiça de regime autoritário –como foi o caso do Armando Falcão.
Existe até anedotário sobre declarações desastradas. Rezam as crônicas que em 1945 o brigadeiro Eduardo Gomes teria perdido a eleição porque havia dito que não precisava do voto dos marmiteiros. Luiz Carlos Prestes precipitou a cassação do Partido Comunista Brasileiro quando teria declarado que, em caso de guerra do Brasil com a União Soviética, ele ficaria ao lado da União Soviética. Mesmo sem ser político profissional, Pelé paga até hoje o custo de ter dito que brasileiro não sabe votar.
O desastre de declarações assim representa um "momento" da trajetória pessoal do desastrado e, por extensão, um "momento" da desastrada crise do país. Marmiteiros não existem mais, as cestas básicas aí estão, redimindo a fome do povo. A hipótese de a Rússia invadir o Brasil é tão remota quanto a de o Brasil invadir a Rússia. Ninguém mais duvida que o brasileiro sabe votar: elegeu Collor e foi para a rua pedir seu impedimento.
Gostaria de concluir uma verdade inapelável, dessas de catecismo ou programa partidário. Prefiro cometer eu próprio uma declaração desastrada: o próximo governo será pior do que o atual.

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