São Paulo, quinta-feira, 3 de fevereiro de 1994
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Câmara aprova rombo no Tesouro

MÔNICA IZAGUIRRE; VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

VALDO CRUZ
Secretário de Redação da Sucursal de Brasília
A Câmara dos Deputados aprovou ontem um projeto de decreto legislativo capaz de comprometer o plano econômico e o esforço do governo em equilibrar suas contas em 1994. Se for aprovado também pelo Senado, o decreto implicará devolver a correção monetária e parte dos juros cobrados sobre o crédito rural nos últimos 14 anos.
Na avaliação do deputado José Serra (PSDB-SP), a aprovação do decreto pode ser "o rombo mais espetacular que já houve nas contas públicas". O deputado Aloizio Mercadante (PT-SP), que votou contra o projeto, disse que o rombo pode atingir US$ 15 bilhões. A bancada ruralista, principal responsável pela aprovação, calcula cifra maior: US$ 20 bilhões.
Só PT e PSDB votaram contra. O PMDB votou a favor do projeto. O líder do governo, Luiz Carlos Santos (SP), peemedebista, não estava no plenário. O texto foi aprovado por 209 votos a 70. O que mais preocupa o governo é o fato de que um decreto legislativo não é sujeito a veto presidencial.
O rombo deve ser pago pelo Tesouro. 90% das operações de crédito rural no país são realizadas pelos bancos federais e estaduais. Nem Tesouro nem Banco do Brasil –maior fornecedor de crédito rural– calcularam até agora qual seria o rombo. O presidente do BB, Alcir Calliari, determinou ontem à noite a suspensão de novas operações de crédito rural até a votação final da medida.
O deputado José Serra disse que "o Tesouro vai ter que desviar recursos da arrecadação de impostos para cobrir o buraco no Banco do Brasil. Caso contrário, o banco quebra em uma semana". Ele acredita ainda que o decreto significaria o fim do crédito rural.
A devolução de dinheiro aos tomadores do crédito rural poderá ocorrer porque o decreto prevê a suspensão retroativa da resolução 590 do CMN (Conselho Monetário Nacional). Datada de dezembro de 1979, a resolução autorizou a cobrança de correção monetária e incidência mensal de juros sobre os empréstimos ao setor rural.
Caso a resolução seja mesmo revogada, fica igualmente suspensa, retroativamente a dezembro de 1979, a cobrança de juros de mora e de outros encargos adicionais em casos de inadimplência, além da contratação de financiamentos para pagar dívida anterior.
O decreto foi proposto pela CPI que investigou as causas do endividamento agrícola. O presidente da CPI, deputado Jonas Pinheiro (PFL-MT), argumenta que uma resolução do CMN não poderia ter extrapolado a lei. E, segundo ele, além de determinar capitalização mensal e não semestral de juros, a lei 4.829/65, que criou o sistema de crédito rural, exige que a cobrança de correção monetária seja estabelecida em lei específica e não em resolução do CMN.
"Não queremos anistia ou perdão. Trata-se de corrigir uma ilegalidade", afirmou o deputado Aldo Pinto (PDT-RS). Ele é produtor rural e tomador de crédito.
Aldo Pinto acha que deve ser devolvida apenas a diferença em relação à correção dos preços. Segundo José Serra, porém, esse sistema, chamado de equivalência produto, não tem amparo legal para incidir retroativamente.
Para Ernesto de Salvo, presidente da Confederação Nacional da Agricultura, a intenção das lideranças rurais foi pressionar o Executivo a tomar medidas contra irregularidades no crédito agrícola.
Caso o decreto passe no Senado, os financiamentos terão forte subsídio, diz Franklin Thame, diretor da federação dos bancos. "Com o atual patamar de inflação, é um absurdo abolir o indexador das dívidas agrícolas."

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