São Paulo, domingo, 6 de fevereiro de 1994
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Ópera de arrabalde

CLÓVIS ROSSI

Opera de arrabalde
SÃO PAULO – Deveria haver um dispositivo constitucional proibindo jornalistas de gozarem férias no exterior. Não adianta nada. O cidadão fica um mês fora, não lê uma única notícia do Brasil; extirpado do mapa da mídia, vê o mundo funcionando lá fora (mal, mas dentro de uma certa lógica fácil de entender mesmo sem ser PhD em coisa alguma). Aí, volta para o Brasil e encontra instalada uma confusão ainda maior do que a já enorme confusão que havia antes. Agora, há disputa dentro do PMDB, que briga com o PSDB, que começa a se desentender em torno da sucessão presidencial, que provoca os primeiros namoricos entre Paulo Maluf e Antônio Carlos Magalhães, depois de um ter desclassificado inteiramente o outro ao longo dos últimos dez anos. Tem briga até no PT, em torno da participação ou não na revisão constitucional.
O cidadão que saiu de férias deixou um escândalo sendo investigado, o do Orçamento. Volta com outro escândalo armado, o dos débitos agrícolas perdoados, sem que ninguém agora fale em CPI, embora a qualidade do assalto aos cofres públicos seja a mesma.
O plano FHC não saiu do lugar nesses 30 dias. Mas o líder do governo no Senado já anuncia que sem o tal Fundo Social de Emergência (FSE), o Planalto vai radicalizar, atacar de congelamento e o diabo. Lidas com atenção, as declarações do senador Pedro Simon poderiam ser traduzidas assim: "Nós sabemos que não funciona, mas vamos fazer assim mesmo".
Simon antecipa a saída de Fernando Henrique Cardoso do ministério, no caso de rejeição do tal FSE. Não deixa de ser curioso. Do jeito que o pessoal trata esse fundo, dá a impressão de que é a pedra filofosal. Alcançado, tudo o mais se acerta e o país decola rumo ao seu grandioso futuro. Rejeitado, é o caos. Algo me diz que essa lógica não encaixa na realidade.
Tudo soa à ópera de arrabalde. Muita gesticulação, palavras ribombantes e alguma baixaria como convém ao arrabalde. Nada de realmente importante aconteceu, talvez sequer aconteça. O importante seria a eleição presidencial e a possibilidade que abriria de se construir enfim uma maioria, qualquer que fosse, para fazer alguma coisa realmente importante. Do jeito que vai...

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