São Paulo, quarta-feira, 9 de fevereiro de 1994
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Em defesa do contribuinte

ABRAM SZAJMAN

Em defesa do contribuinte
As intermináveis discussões acerca do porte do Estado (nas suas três dimensões –federal, estadual e municipal) e a capacidade do contribuinte sustentá-lo com todas as suas precariedades e necessidades terminam por entristecer o empresário que enfrenta, nesse momento de inflação elevada e consumo inelástico, graves preocupações com a própria sobrevivência.
Ainda não foram claramente equacionadas as questões referentes às exigências do governo federal de reforçar seu caixa e já surge a administração pública do Estado de São Paulo reclamando uma ajuda extra do contribuinte. Em 28 de janeiro, o governo do Estado de São Paulo editou o decreto 38.355 que, em síntese, procurava aumentar a arrecadação de ICMS por modificações na sistemática de sua cobrança.
A controvérsia que opõe os empresários e os administradores das finanças do estamento governamental consiste, basicamente, em uma só: não é possível esticar indefinidamente a capacidade de pagar impostos dos cidadãos, porque estes simplesmente perdem, a cada instante, uma parcela de sua capacidade de fazer negócios e manter a atividade econômico-financeira do país.
Na realidade, o problema é bastante mais grave do que determinar até que ponto tais ou quais medidas são justas ou adequadamente construídas do ponto de vista técnico ou jurídico, porque nele está contida uma questão mais elementar e essencial, que é a da capacidade do público consumidor sustentar um nível de atividade adequado para manter todas as parcelas da população seja produzindo, seja intermediando a venda de produtos, seja criando legislação e normas para cobrar impostos e sustentar o Estado.
Se um dia a fonte secar, isto é, se em determinado instante não houver mais dinheiro suficiente para adquirir bens e pagar impostos, todos os brasileiros –sejam eles governantes ou governados– terão de enfrentar a verdade elementar de que ninguém pode gastar, durante um largo período de tempo, mais do que ganha.
Cabe observar, portanto, em relação ao artigo do secretário da Fazena do Estado de São Paulo, economista Eduardo Maia, publicado nesta Folha, segunda-feira, 7 de fevereiro, em primeiro lugar, que a indexação do saldo do ICMS pela Unidade Fiscal do Estado de São Paulo (Ufesp) corresponde a um aumento do valor desse imposto, visto que passa a ser cobrado diariamente. Como os homens práticos e os teóricos estão de acordo que aumento de preço terá de ser pago por alguém, é inevitável a conclusão de que ele será pago pelo consumidor, que já se queixa de falta de capacidade financeira para comprar. Portanto, terminará por ser mais um fator de esfriamento da atividade econômica, fato que ninguém em sã consciência pode querer neste momento.
Não é comum, no empenho em defender posições teóricas, que surjam afirmativas verdadeiras, mas não na extensão que gostaríamos que elas atingissem: por exemplo, a de que micro e pequenas empresas estão fora do atual aumento do ICMS. Ora, estão fora as micro (que só recolhem Cofins, que é federal) e as poucas pequenas empresas que recolham o imposto por estimativa. Mas a maioria desistiu dessa alternativa quando percebeu que teria de arcar com valores muito elevados.
Comprova-se que, do ponto de vista financeiro, os beneficiados pertencem a um universo consideravelmente restrito.
A arrecadação de ICMS, que andou, no final da década anterior, por volta de US$ 10 bilhões, caiu para menos de US$ 8 bilhões nos últimos anos. Mas também é verdade que, em relação a 92, a arrecadação de 93 cresceu 5,1%. Muita água correu por baixo da ponte, o caixa dos Estados (e não só o de São Paulo) anda despencando. Mas não seria o caso de parar para pensar e tentar equacionar a questão do ponto de vista do cidadão contribuinte? Será que ele não está sendo demasiadamente escorchado?
Ao longo dos anos, o Estado manteve sua arrecadação, enquanto a expansão da economia não se sustentou. É chegada a hora de o Estado adaptar-se às condições de uma economia de menor porte. Esperamos que o governador do estado, que já mostrou sensibilidade em relação aos problemas dos empresários, principalmente das pequenas e micro, reveja agora o decreto 38.355 e opte, também ele, pela defesa do contribuinte.

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