São Paulo, quarta-feira, 9 de fevereiro de 1994
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São Paulo pode sair ileso da turbulência

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O tricolor mergulhou numa turbulência nos últimos dias, mas pode sair ileso esta noite, caso vença o Guarani, o que, convenhamos, não é feito fácil. Afinal, o Guarani vem cumprindo boa campanha no campeonato e possui um time à altura de incomodar seriamente os favoritos, sobretudo através da picardia de Djalminha e da voracidade de gols de Clóvis (inexplicável que nenhum grande do eixo Rio-São Paulo tenha investido sobre o passe desse goleador, revelado na temporada passada).
Mas, ontem, as nuvens começaram a ser espantadas do Morumbi, com a reforma de contrato de Moraci Sant'Anna, um preparador físico que conseguiu a façanha de se igualar em importância aos grandes treinadores. Sim, porque o acervo de títulos colecionado pelo tricolor nos últimos três anos não tem paralelo na história de nenhum clube brasileiro. E um dos suportes dessa incrível campanha, sem dúvida, foi a preparação física da equipe, executada em moldes inéditos no Brasil, quem sabe, no mundo. Quando se esperava que o time iria abrir o bico, lá estavam os tricolores disparando em campo como se tivessem saído de um sono de monge e uma sauna de viking.
Mesmo porque comentava-se pela cidade que Moraci já tinha seu encontro marcado com o Palmeiras, que iria mais fundo, contratando Cafu.
Meu Deus! Se isso acontecesse, o mais sábio seria a Federação marcar a tabela, dar a taça e a faixa de campeão ao Palmeiras e deixar os outros disputarem o segundo lugar, que viraria o primeiro.
*
Tenho horror a esse negócio tão vil que o brasileiro prefere se referir a ele em francês, como se em português não houvesse equivalência. Ah, se verdadeiro fosse! Falo desse tal de "esprit de corp", que, no fundo, é uma tremenda covardia. Nunca me filiei a partido político, nem frequentei clubes, tampouco integrei tchurma alguma e me arrepio quando ouço falar em grupo. Talvez seja um vezo de infância cevada no velho Brás, onde você aprendia a sair de casa com uma mão estendida e um cabo de aço no bolso de trás da calça. Se o cara apertava sua mão, passava a ser amigo eterno. Caso contrário, o cabo de aço era seu maior amigo.
Talvez fosse aquela cultura da individualidade cultivada pelos filmes de Bogart e John Wayne, onde havia solidariedade, sim, mas que cada um cuidasse de si. E ninguém avalizaria o mal-feito do outro, a não ser num gesto de auto-sacrifício, o que assegura a individualidade.
Digo isto a propósito de dois bate-bocas que se produziram neste início de semana, no rádio e na TV, entre jornalistas e cartolas.
Na segunda à noite, no programa do Wanderley Nogueira, na Record, Henrique Alves, diretor de futebol do Corinthians, e Dalmo Pessoa, quase se engalfinharam nos estúdios da TV. No dia seguinte, na Jovem Pan, Fernando Casal de Rey, do São Paulo, e Flávio Prado, trocaram farpas venenosas.
Como nessas discussões todos se excedem e tudo se omite, me senti como o Boldrin naquele comercial de cimento, encostado no balcão do velho armazém.
E, com aquele olhar malígno-benévolo típico da zona leste que os dois confrades, filhos da Penha, bem conhecem, vi o Dalmo puxar o cabo de aço e esquartejar o Henrique; já o Flavinho sacou da ironia, e dançou. Como diziam os mais velhos, a briga é ganha por quem tem mais razão e mais raiva. E briga de rua, gente, no velho Brás, era uma arte.

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