São Paulo, sábado, 12 de fevereiro de 1994
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Folguedos parlamentares

A desfaçatez dos parlamentares parece não conhecer limites. Pressionada pela indignação da sociedade face ao injustificável absenteísmo verificado no Congresso (ainda mais num momento tão crítico para o país), a Mesa da Câmara prometeu esta semana fazer aquilo que deveria estar sendo feito há muito tempo: realmente punir, com o desconto no salário, deputados que faltarem às sessões da Casa.
Não é muito, evidentemente, já que essa situação é apenas aquela há tempos conhecida de toda a população. Pior, a disposição é referente apenas às sessões deliberativas (o que normalmente exclui no mínimo as segundas e sextas-feiras) e o registro é feito de modo a permitir que um parlamentar mal passe pelo Congresso e seja considerado presente. Assim é que na quinta-feira à tarde, os 229 deputados formalmente registrados se resumiam de fato a aproximadamente 30 no plenário. Mesmo assim, a disposição de punir ainda poderia representar algum avanço no sentido da moralização da atividade política.
No primeiro dia da vigência dessa nova disposição, contudo, o espírito de corpo falou mais alto. Prevendo baixo quórum na quinta-feira (dado o longo Carnaval parlamentar), as lideranças partidárias na quarta esvaziaram a pauta do dia seguinte, para retirar o caráter deliberativo da sessão e permitir a ausência de deputados sem desconto no salário. A Mesa da Câmara, responsável pela definição da pauta, nada fez para impedir a manobra.
Não há desculpa possível para o acinte. Independentemente dos meandros regimentais, o fato é que, em meio a uma grave crise e diversas votações urgentes, congressistas anteciparam seus folguedos cuidando ainda de proteger o bolso com malabarismos tecnicistas.
Só os parlamentares parecem não perceber o extremo desgaste que têm provocado, com o conjunto de suas atitudes, não só na própria imagem como na do Legislativo. E se os indivíduos podem felizmente ser substituídos pelo voto, ou cassados pela falta de presença ou decoro, a instituição é um dos alicerces básicos da democracia.

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