São Paulo, domingo, 13 de fevereiro de 1994
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Soljenitsin fecha o ciclo de seu exílio

FERNANDA GODOY
DE NOVA YORK

Hoje, quando se completam 20 anos de sua expulsão da hoje extinta União Soviética, Alexander Soljenitsin, 75, está arrumando as malas para voltar a Moscou. O escritor russo decidiu fechar o ciclo de seu exílio. Seu retorno está previsto para uma data ainda não anunciada, provavelmente em maio deste ano.
Quando se concretizar a volta dele à Rússia, os moradores da minúscula Cavendish poderão retirar do mapa aquela que é virtualmente a única indicação da presença do mais famoso exilado russo em solo norte-americano: uma placa com os dizeres "No directions to the Soljenitsyn home" (em portugês claro, "não ensinamos a chegar à casa de Soljenitsin").
Desde 1976, o autor de "Arquipélago Gulag" e "Um Dia na Vida de Ivan Denisovich" praticamente se esconde nessa cidade de Vermont (nordeste dos EUA), próximo ao Canadá.
Antes de chegar aos Estados Unidos, Soljenitsin viveu dois anos na Suíça. Mas a Europa era povoada demais. Nos últimos 18 anos em Vermont ele tem levado uma vida de eremita. Praticamente não sai de casa, não recebe visitas nem atende telefonemas. Jamais se tornou fluente em inglês, língua com a qual só se sente confortável para ler. Trabalhou sete dias por semana, do amanhecer à noite, em seu colossal –mais de 5.000 páginas– estudo da história russa "A Roda Vermelha", do qual apenas o primeiro de quatro volumes ("Agosto de 1914") já foi publicado.
Ao contrário do que poderia esperar a direita norte-americana na vigência da Guerra Fria, a vinda de Soljenitsin não pôde ser capitalizada em discursos e aparições públicas. Por dois motivos: primeiro, a indisponibilidade do escritor, que simplesmente não estava interessado em percorrer os Estados Unidos ou debater suas idéias; segundo, seus comentários sobre a "decadência moral" do Ocidente logo o tornaram inconveniente. Sua última aparição foi em uma formatura em Harvard, em 1978. Depois disso, caiu no ostracismo.
Sua partida deverá ser igualmente discreta. Seu editor, Claude Durand, disse à Folha por telefone, de Paris, que Soljenitsin não tem intenção de fazer qualquer despedida pública dos Estados Unidos.
Em uma rara entrevista, à revista "The New Yorker", Soljenitsin disse: "Sei que jamais terei uma chance de trabalhar tão calmamente de novo. Na Rússia, serei dilacerado pelos acontecimentos e pelas tragédias das pessoas".

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