São Paulo, segunda-feira, 14 de fevereiro de 1994
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A folia corre solta nos gols palmeirenses

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O Carnaval chegou aos campos de futebol vestindo a fantasia dos gols trabalhados em paetês, miçangas e lantejoulas.
Começou com o André, em Americana. Foram três gingas desconcertantes, com a elegância e contenção de um mestre-sala; três inimigos no chão e a bola no fundo das redes do Rio Branco.
É bem verdade que, depois de pleno domínio no primeiro tempo, o São Paulo safou-se de um sufoco angustiante no segundo, quando o Rio Branco controlou a bola, os espaços e os nervos do jogo. Sobretudo, depois que a impotência de Vítor na direita somou-se à contusão de André na esquerda.
O tricolor não só perdeu a força de ataque como abriu seus flancos para o adversário, que deitou e rolou. Só não marcou porque Zetti se reencontrou com seu futebol.
Já passou da hora de o São Paulo renovar os contratos de Cafu e Muller, pois o time está queimando as últimas reservas de sorte que os deuses destinam aos fadados a campeão.
*
Mas foi no Parque Antarctica que a folia correu solta, neste sábado de Carnaval. Pois se o tricolor salvou-se com um gol de placa, o Palestra não fez por menos. Perpetrou duas pequenas obras-primas de puro brilho artesanal: os dois primeiros gols de Edmundo, na goleada de 4 a 0 sobre a Lusa, completada por Evair.
Nos dois gols, o talento de Edmundo. Mas, principalmente, o gênio de Rincón. Hoje, arrisco dizer, o mais completo craque do mundo. Sim, porque soma, dos pés à cabeça, um acervo de atributos que não se reúnem todos num só outro jogador conhecido.
Talvez, apenas Ruud Gullit, uma explosão de genialidades, mas que não possui a frieza e a precisão nos passes de Rincón.
Com 1m87, 82 quilos, Rincón move-se com sabedoria no campo, alternando uma falsa lentidão, ao estilo do Divino Ademir da Guia, com incontroláveis disparadas. Reduz e amplia os espaços de acordo com as exigências do jogo. Fecha-os para os adversários, quando atacado; abre-os para os companheiros, quando ataca. É bom de cabeça, quando sobe na área inimiga, embora tenha facilitado o gol contrário, outro dia, quando na sua área. É clarividente quando a utiliza para desvendar o melhor lance, quase sempre no contrafluxo do óbvio.
Nisso, faz lembrar um pouco o dr. Sócrates, com quem, aliás, se identifica mais nos toques de calcanhar que viram a defesa oponente do avesso, como no segundo gol de Edmundo, sábado, ou no de Maurílio, contra a Ponte há quinze dias. Este foi um primor –um verdadeiro lançamento de calcanhar para Roberto Carlos, que cruzou para Maurílio marcar.
Que mais se pode exigir de um craque, capaz de conjugar a seus pés o exato sentido de solidariedade com a medida certa de irreverência individual que dão solidez ao seu time e arrancam delirantes aplausos da galera?
Seu único defeito: não ter nascido no Brasil, o país dos camisas 10, dos quais somos hoje um órfão solitário.
*
Neste fim-de-semana, vi na telinha desfilarem alemães, espanhóis e italianos. Como sempre, os espanhóis atravessaram o ritmo. Correm muito, batem muito e não jogam nada.

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