São Paulo, quinta-feira, 17 de fevereiro de 1994
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Se for candidato, FHC terá voto de d. Paulo

KENNEDY ALENCAR
DA REPORTAGEM LOCAL

Se for candidato, FHC terá voto de d. Paulo
O cardeal-arcebispo de São Paulo, d. Paulo Evaristo Arns, votará em Fernando Henrique Cardoso (PSDB) para presidente, caso o ministro da Fazenda dispute a eleição, segundo apurou a Folha. D. Paulo não fala isso publicamente para evitar conflito dentro da Igreja católica, que é proibida de apoiar candidatos e partidos devido a normas internas. Mas diz abertamente que ainda acha "possível" uma aliança entre o PT e o PSDB nas eleições, mas não agora porque "há grupos radicalizados nos dois partidos".
Sobre o perfil ideal de um candidato à Presidência, D. Paulo afirmou que ele deve ser "capaz, ético, inteligente e com traquejo para trabalhar em equipe". Perguntado sobre quem seria seu candidato, d. Paulo disse que já havia feito sua escolha e que a Folha sabia qual era. O cardeal deu entrevista à Folha ontem após a celebração da missa que abriu a Campanha da Fraternidade em São Paulo. O diálogo foi o seguinte:
*
Folha - É o ministro Fernando Henrique?
D. Paulo - Tire as suas conclusões. A Igreja não pode apoiar explicitamente ninguém.
Folha - É o Lula?
D. Paulo - Não posso recomendar candidatos. É contra o direito canônico.
Folha - Mas a sua opinião é importante para o eleitor.
D. Paulo - Não posso brigar com a Igreja porque isso prejudica a Igreja e a nação.
Folha - Qual a sua opinião sobre Fernando Henrique?
D. Paulo - O Fernando Henrique é um homem muito capaz, que trabalhou comigo durante um longo tempo. Fizemos parte de um grupo (equipe da Arquidiocese de São Paulo que discutia problemas brasileiros) que imaginou como seria o Brasil. A Igreja nos chamava de "grupo dos loucos" porque cada um dizia o que queria.
O cardeal afirmou que sua opinião a respeito de uma aliança entre o PT e o PSDB era "muito pessoal". Disse que a viabilidade da aliança estava impedida momentaneamente, mas que essa situação poderia mudar: "Suponho que todos os empecilhos em política podem ser removidos".
Segundo d. Paulo, a participação da Igreja nas eleições deve se dar através do incentivo para que todos votem. Disse ser contra campanhas por votos nulos e brancos. Votar é "dever de todo católico".
A educação, o desemprego, a falta de moradia e o abandono da saúde são os principais problemas que o próximo presidente deverá enfrentar, disse d. Paulo. Para ele, isso provoca a fome, a miséria e a desagregação da família (tema da Campanha da Fraternidade neste ano). Durante a missa de ontem, o cardeal disse ser "uma vergonha" os políticos discutirem se o salário mínimo deveria ser 55, 56 ou 57 dólares. D. Paulo pedia que os fiéis repetissem com ele várias vezes: "100, no mínimo".
Elites
O cardeal D. Paulo defendeu o documento "Brasil: Alternativas e Protagonistas", elaborado pela Pastoral Social da CNBB. Divulgado anteontem pela Folha, o documento afirma que existe no país uma "democracia das elites" e recomenda que o eleitor tenha uma "revanche nas eleições contra os políticos que traem seu mandato". O cardeal acredita que é preciso mudanças que atendam aos "70 milhões de brasileiros que vivem na pobreza o os 30 milhões que vivem na miséria".
Para d. Paulo, as elites brasileiras não corresponderam à responsabilidade que receberam. Nesse ponto, d. Paulo avalia que a Igreja tem parcela de culpa, pois "deu acolhimento às elites em suas instituições de ensino com o objetivo de formar lideranças para a nação". Segundo ele, isso falhou.

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