São Paulo, quinta-feira, 17 de fevereiro de 1994
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É ridículo

Que o presidente Itamar Franco foi no mínimo desastrado ao exibir-se no Sambódromo ao lado de uma modelo seminua, não resta dúvida. Mas também não há dúvida alguma quanto ao fato de que o comportamento infeliz de um chefe de Estado não figura entre os motivos para o seu impeachment, ao contrário do que demandam algumas vozes do empresariado e até da Igreja. Afirmar, como o fez o governador da Bahia, Antônio Carlos Magalhães, que, em outros tempos, um episódio do gênero teria derrubado o governo é licença poética.
Na prática, a algazarra feita em torno do caso está ganhando um caráter ridículo. Transformar um episódio burlesco em uma crise institucional, em ameaça para o futuro do Plano FHC, como pretendem alguns, é exagero próprio de samba-enredo de escola do grupo 2.
Ninguém nega o direito de qualquer cidadão de criticar o comportamento do presidente. A Folha já o fez, neste espaço. Mas transformar o exercício da crítica em um ensaio de crise institucional é muito diferente e totalmente injustificado.
Não é preciso muita argúcia nem elevado saber intelectual para perceber que o país enfrenta problemas muito mais graves do que a ausência de uma peça de roupa íntima em uma acompanhante circunstancial do presidente da República. O mau comportamento carnavalesco do presidente não é, necessariamente, sinônimo de inaptidão para o exercício do cargo. Itamar pode até ser considerado incompetente para exercer a Presidência da República. Mas não pelo seu desempenho desastrado no Sambódromo.
A crise brasileira tem componente multifacetados e bem reais. Criar uma crise institucional artificial a partir do comportamento do chefe de Estado no Carnaval é cometer no mínimo uma imprudência. No fundo, trata-se de um episódio destinado a enriquecer o já alentado folclore que cerca o Palácio do Planalto e inúmeros outros prédios públicos que simbolizam o Poder na República. E nada mais.

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