São Paulo, quinta-feira, 17 de fevereiro de 1994
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Nota 10 para a manequim

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – As cenas do camarote entre Itamar Franco e a manequim sem calcinha foram impróprias para um presidente da República. Mas algumas das críticas geradas pelo episódio conseguem ser ainda mais impróprias. O ponto é o seguinte: uma calcinha (ou, no caso, a falta) não merece uma crise institucional.
Um grupo de empresários, apoiado por padres e parlamentares, anuncia ação de impeachment por falta de decoro. Pergunto: vamos derrubar um presidente em fim de mandato, em meio à sucessão, por causa de uma modelo sem calcinha? Ora, não sejam ridículos.
O senador Esperidião Amim prevê dificuldades para aprovação do plano econômico no Congresso. O sindicalista Luiz Antônio de Medeiros: "O episódio pode trazer um descontrole da economia e afetar o combate à inflação".
Há outra argumentação que considero imprópria: atacar a manequim, classificada por alguns como "vagabunda", "piranha" e até "reles prostituta". Engano: ela cumpriu exatamente seu papel. Ou seja, o papel de perua deslumbrada atrás de fugaz notoriedade.
Lílian Ramos sabia exatamente o que fazia –e sabia exatamente o que não estava usando por baixo da justa camiseta. Tinha certeza de que, postada ao lado do presidente, viraria o centro das atenções e dos fotógrafos. Traduzindo: como perua deslumbrada, ela merece nota 10.
Quem não sabia seu papel era o presidente. Se ele conhecesse seu papel tão bem quanto a manequim, nada teria acontecido. Ou mellhor, quem sabe tudo teria acontecido. Explico melhor.
Ele é solteiro e poderia até ter travado contato menos público com a manequim –ninguém proíbe um presidente de ter vida sexual.
Do jeito que acabou, ele manchou a imagem de um presidente, ficou com a fama de ingênuo para uns e depravado para outros –e, para completar a comédia, nem teve um fugaz caso.
PS – Há líderes políticos sustentando que Itamar Franco deveria cair pela baixaria. Mas, alguns deles, não se incomodaram em defender até o último momento Fernando Collor –mesmo sabendo quem era e o que tinha feito com o dinheiro público. O episódio da calcinha é, pelo menos, de graça.

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