São Paulo, quinta-feira, 17 de fevereiro de 1994
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A Pompadour do asfalto

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – Tudo é questão de ângulo –acho que a frase é de Pitágoras, ou Euclides, sei lá. O fato é que, na Sapucaí, a questão do ângulo superou outras questões e ângulos.
Vamos por partes. O presidente arrebanhou uma modelo na passarela –fato comum nas relações entre o poder e a plebe. As Pompadour do asfalto sempre deram sopa e sempre esperaram um sinal de cima para subir. Na corte de Luís 15 não havia fotógrafos, mesmo assim os "retratistas" da época fizeram o que puderam.
Pessoalmente, não culpo Itamar nem a modelo, não culpo ninguém e nada. A grande lição da Quaresma é a de que a carne é fraca, embora a carne da Pompadour escolhida seja bastante nutritiva e abundante.
Não creio que o episódio tenha consequências. Afinal, como já comentei na crônica de ontem, o presidente ganhou previamente dose dupla de preservativos. Nem a modelo corre o risco de ficar prenha (Orestes Quércia relançou a palavra a propósito do governador cearense), nem o presidente correrá o risco de se tornar soropositivo. Quem está ameaçado de pegar um desses vírus complicados, tipo UVC ou HIV (tudo é sigla) seremos todos nós. Vamos aguardar os acontecimentos.
Outro ângulo que desejo comentar: não entendi como certa marca de cerveja, que gastou verbas com o Carnaval e o desfile da Sapucaí, teve o péssimo gosto de colocar aquele cartaz no começo da passarela. Cartaz feio, quase obsceno, que não diz nada absolutamente e só serviu para poluir a perspectiva –a bela perspectiva das escolas que se esbofaram o ano inteiro, gastaram os tubos para obter um sentido plástico. Tudo prejudicado pelo imenso cartaz que murou com mau gosto a linha visual das escolas e do próprio sambódromo.
Acredito que Oscar Niemeyer, tão cioso de suas obras, deve ter reclamado do cartaz. Aquele dedo duro e mal realizado parecia telão de teatro mambembe quando não há engenho, arte ou gaita para cenário decente.
O ano promete mais e melhor: a Copa do Mundo e as eleições. No Brasil, pode-se morrer de fome –e muita gente morre mesmo, apesar das cestas básicas do Betinho. Agora, ninguém tem o direito de morrer de tédio.

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