São Paulo, sábado, 26 de fevereiro de 1994
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Thomas Mann

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – O autor de "Morte em Veneza" está sendo discutido, ele que sempre foi lido –um dos mais lidos neste século. Não faltam aqueles que o consideram o maior escritor do nosso tempo –o que talvez seja verdade, com uma ressalva: Thomas Mann –como a maioria dos intelectuais alemães– é muito mais um pensador, um detonador de idéias do que um romancista. A comparação mais próxima que me ocorre é com o Machado de Assis que insistiu em fazer poesia. Seus versos e seus sonetos são perfeitos, mas ele nunca é um poeta.
Thomas Mann se expressou, basicamente, em romances. Insistiu no gênero. Foi convocado, pela intelectualidade alemã, para ser o porta-voz nacional nas comemorações do segundo centenário de Goethe. Mann foi isso exatamente: a voz e consciência de uma Alemanha. Insisto: ele usou o romance como veículo para aquilo em que os alemães de gênio são insuperáveis: pensar, refletir, questionar.
Outro nome que agora me ocorre: Nietzsche, que optou por escrever fragmentos e só raramente procurou um tênue fio condudor para expressar sua visão do mundo (ou desvisão no caso dele).
As melhores obras de Mann mal disfarçam a incompatibilidade entre o pensador e o narrador. Por isso mesmo, seu livro mais importante, "O Doutor Fausto", é uma grave meditação sobre o espírito do homem, sendo irrelevante o lado episódico do romance. Certo que "Os Buddenbrook" constitui uma narrativa tanto quanto possível próxima dos grandes romancistas franceses, ingleses, espanhois e russos. "A Montanha Mágica" fica no meio do caminho: sua importância é a paródia do declínio moral da Europa nas primeiras décadas do século.
Sou curtidor de Thomas Mann, dei-me ao trabalho de visitar sua casa natal, em Lubeck, já transformadda em museu. Gosto muito desse trecho do seu "Ein Appell an die Vernunft": – "Há momentos de nossa vida comum em que a arte não consegue se justificar... e tudo aquilo que chamamos de arte chega a parecer ocioso, efêmero, um bem supérfluo, uma impossibilidade mental..."

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