São Paulo, domingo, 27 de fevereiro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

'Xerife' de direitos humanos quer verba

FERNANDA GODOY
DE NOVA YORK

O equatoriano José Ayala Lasso, 62, será empossado no dia 1º de abril no cargo mais polêmico da ONU (Organização das Nações Unidas): alto comissário para direitos humanos. Diplomata de carreira –foi embaixador de seu país na Bélgica, em Luxemburgo, no Peru e junto à Comunidade Européia–, Ayala Lasso vai precisar de toda a sua experiência no ramo para defender os direitos humanos em todo o planeta conciliando os pontos-de-vista dos 184 países-membros.
Mas ele vai precisar também de mais do que seu atual orçamento bianual de US$ 1,4 milhão e promete brigar por isso. O alto comissário diz que pretende apresentar um plano de trabalho –e de recursos– e exigir dos países que apoiaram a criação do alto comissariado para direitos humanos que não o deixem cair no vazio da demagogia e da inoperância.
Três dias após a ratificação de sua escolha pela Assembléia-Geral da ONU, Ayala Lasso recebeu a Folha para uma entrevista. A seguir, os principais trechos:
Folha - O sr. tem metas específicas sobre o que pretende alcançar durante seus quatro anos de mandato?
José Ayala Lasso - Eu já estou preparando um plano de ação que falará em metas de curto, médio e longo prazos. A meta mais importante é fortalecer o que eu chamo de "o espírito de Viena". Durante a Conferência dos Direitos Humanos em Viena, em junho do ano passado, foi possível pela primeira vez chegar a um consenso para atacar o problema dos direitos humanos de uma perspectiva global.
Folha - No processo de negociação para a criação do cargo, a figura do alto comissário também perdeu alguns poderes, como por exemplo o de realizar expedições para investigar violações de direitos humanos nos países. Como o sr. vê esse enfraquecimento?
Ayala Lasso - Minha percepção é completamente oposta a essa. Eu acho que o consenso obtido entre os 184 países-membros é a mais importante arma, a maior fonte de poder do alto comissário. Essa autoridade moral é mais importante do que qualquer autoridade específica para investigações.
Folha - Sua nomeação não foi bem recebida por algumas ONGs (organizações não-governamentais). Como anda o seu relacionamento com elas?
Ayala Lasso - Minha política é de cooperação amistosa, de portas abertas. Quanto às críticas: seria pretensioso da minha parte ficar me elogiando, mas seria desrespeitoso acreditar que o secretário-geral da ONU e os 184 países-membros aprovariam alguém que não fosse capacitado.
Folha - Alguns governos, como o brasileiro, reclamam que as ONGs só apontam falhas e violações dos direitos humanos e apenas recentemente passaram a incluir em seus relatórios os esforços dos governos para solucionar esses problemas. Qual será o seu papel neste âmbito?
Ayala Lasso - O alto comissário não deve apontar culpados ou condenar, mas sim promover os direitos humanos em todos os países. E uma das melhores maneiras de fazer isso é convencer os governos de que respeitar os direitos humanos é de seu próprio interesse. Eu colocarei o Centro de Direitos Humanos da ONU à disposição dos governos para assistência técnica, ajuda, aconselhamento.
Folha - Para isso, o sr. vai precisar de mais dinheiro do que o US$ 1,4 milhão de seu orçamento, não?
Ayala Lasso - Com certeza. Mas eu acredito que, se há seriedade na decisão de dar ao alto comissário esta missão, também haverá seriedade para lher dar os necessários recursos humanos e financeiros.
Folha - O que o sr. está dizendo é que seria hipócrita criar o cargo e não dar os recursos? Ayala Lasso - Sim. E eu não aceitarei isso.

Texto Anterior: Jirinovski não perde mandato, diz assessor
Próximo Texto: Alto comissário diz que recebeu condolências
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.