São Paulo, domingo, 27 de fevereiro de 1994
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Centenário do caso Dreyfus reabre debate

FERNANDA SCALZO
DE PARIS

Uma pesquisa encomendada pela Liga dos Direitos do Homem e publicada na revista "La Vie" revela que 68% dos franceses acreditam que as questões levantadas há cem anos pelo caso Dreyfus continuam atuais. Em dezembro de 1894 o capitão Alfred Dreyfus, judeu francês da Alsácia, foi acusado de alta traição e condenado pelo Conselho de Guerra à deportação perpétua. Depois de 12 anos de prisão, Dreyfus foi libertado, reabilitado e nomeado comandante.
Segundo a mesma pesquisa, 45% dos franceses acreditam que o racismo e o anti-semitismo aumentaram em seu país nestes últimos cem anos. Mas hoje, mais que a religião (28%), a origem étnica de um indivíduo (33%) seria o motivo de uma eventual injustiça (leia texto abaixo), de acordo com os franceses entrevistados pela revista.
Os franceses afirmam também que se sentiriam mais incomodados em votar em um presidente que fosse francês naturalizado (37%) do que em um que fosse judeu francês (13%).
Difícil de engolir
Nesta comemoração dos cem anos do caso Dreyfus (um pouco apressada, já que o capitão foi condenado em dezembro), com a avalanche de livros e reportagens sobre o assunto vê-se que este é mais um episódio da história difícil de engolir para os franceses (assim como o colaboracionismo com a ocupação nazista durante a Segunda Guerra Mundial). Para 51% dos franceses, a escola deveria falar mais do episódio.
Acusado de ter passado informações aos alemães sobre material da artilharia francesa, o capitão Dreyfus foi condenado sem provas e enviado à prisão perpétua na Ilha do Diabo, na Guiana. Intelectuais saíram em defesa do capitão, como o escritor Émile Zola, que publicou no jornal "L'Aurore", em 13 de janeiro de 1898, a famosa carta "J'accuse" (Eu acuso), dirigida ao presidente da República. A carta valeu a Zola a condenação a um ano de prisão e uma alta multa.
Justiça tardia
Nesta época, o capitão Dreyfus já estava havia mais de três anos na prisão e as Forças Armadas e o povo francês já sabiam bem que o capitão era inocente. Mas defender Dreyfus significava necessariamente desmoralizar o Exército e a polêmica que invadiu todas as casas se tornou mais um caso de paixão que de razão.
Os que apoiavam o capitão Dreyfus passaram a ser imediatamente tachados de antimilitaristas e a justiça só pôde ser feita 12 anos depois, em 1906. Dreyfus morreu aos 75 anos, em 1935, como tenente-coronel.

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