São Paulo, sexta-feira, 4 de março de 1994
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Você confia nos religiosos?

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Iria comentar as pesquisas que estão chovendo no Palácio do Planalto e Ministério da Fazenda, apontando a expressiva subida de Fernando Henrique Cardoso na disputa presidencial –uma delas o coloca em segundo lugar. Um médico mudou minha idéia.
Numa carta publicada hoje pelo Painel do Leitor, o presidente da Associação Paulista de Medicina, José Knoplich, mostra-se aborrecido devido a coluna intitulada "Você confia nos médicos?". Em essência, ele acha que os médicos são fiscalizados e punidos na medida certa.
Vejamos seu argumento: "O atentado em Nova York, em 1992, supostamente por um religioso egípcio muçulmano e o atentado de Hebron (Israel), realizado por um médico religioso judeu, levariam o articulista a escrever 'Quem confia nos religiosos?' ".
Sou levado a suspeitar que o dr. Knoplich parece mais preocupado em salvar os médicos do que os pacientes. Devido à tentação pelo sofisma, ele acaba involuntariamente aderindo à lógica do médico judeu responsável pelo atentado em Hebron. Afinal, sua carta coloca, na prática, uma categoria acima do fundamento elementar da medicina: preservar a vida.
A questão central é a seguinte: alguém está convencido de que todos ou pelo menos um razoável número de médicos que cobram preços extorsivos ou cometem erros são punidos? Podemos confiar na seriedade de todos os hospitais?
Não houvesse uma sensação de impunidade, o Brasil teria obtido o título de campeão mundial de partos cesarianas, mais arriscados para a mãe e mais lucrativos para médicos? Por que, por exemplo, segundo o dr. Aloysio Campos da Paz, uma operação de ponte safena é três vezes mais cara no Brasil do que nos Estados Unidos? "O número de cirurgias desnecessárias em nosso país é um escândalo", afirma dr. Aloysio.
PS – Aliás, o ortopedista Aloysio Campos da Paz, professor visitante de algumas das mais importantes faculdades do mundo, apresenta uma grave denúncia. "É muito comum médicos que chefiam centros de radiologia de hospitais públicos terem suas próprias clínicas radiológicas". E acrescenta: não menos comum é que nos hospitais públicos os aparelhos, por coincidência, quebrem com frequência e demorem para serem concertados –o que significa clientes para clínicas privadas.

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