São Paulo, sábado, 5 de março de 1994
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Supremo não dispõe de provas para punir Collor por corrupção passiva

FLÁVIA DE LEON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O STF (Supremo Tribunal Federal) não tem provas para condenar o ex-presidente Fernando Collor de Mello por corrupção passiva, crime de que é acusado. Não existem, no processo, provas materiais de que Collor tenha recebido dinheiro em razão de seu cargo ou por troca de favores. O Supremo está preocupado em pagar o ônus político de uma eventual absolvição após avaliar que o Ministério Público não produziu provas.
O Ministério Público, autor da acusação, não produziu provas durante o processo de que a Operação Uruguai -um contrato de US$ 5 milhões dos quais teriam sido sacados US$ 3,57 milhões- é falsa. Também não provou que o ex-presidente recebeu dinheiro de alguma empresa por tê-la favorecido. Tampouco há acusação ou prova de utilização de dinheiro público.
Isso não significa, porém, que Collor possa ser absolvido pelo Supremo. O ministro-relator, Ilmar Galvão, pode encontrar algum outro crime envolvendo o dinheiro recebido pelo ex-presidente através das contas bancárias de sua secretária, Ana Acioli, e remeter o caso a outro julgamento.
Esse crime pode ser, por exemplo, eleitoral. Collor não negou que recebeu dinheiro e o usou para reformas na Casa da Dinda, despesas pessoais e compra do Fiat Elba. O ex-presidente afirmou que o dinheiro havia sobrado da campanha eleitoral e não há provas em contrário. No caso de existir crime eleitoral, pelo uso de saldos da campanha, o STF terá primeiro que verificar se é competente para esse julgamento ou remeter o caso para o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Três acusações pesam contra Collor. Na opinião de ministros do STF, todas são "inverossímeis". A primeira é de que ele teria recebido propina para nomear Marcelo Ribeiro para a Secretaria dos Transportes. Ele ficou apenas seis meses no cargo e declarou ser amigo de "infância" de Collor.
O ex-presidente é acusado, também, de ter favorecido o empresário Wagner Canhedo na compra da Vasp através de seu cunhado e ex-secretário, Marcos Coimbra. A terceira acusação é de ter financiado a campanha de Sebastião Curió através da Mercedes-Benz. Mas não existem provas de sua participação nestes episódios.
As provas produzidas durante o inquérito policial não podem ser utilizadas no julgamento. Elas ferem o princípio do contraditório. Toda a documentação obtida pela polícia deveria ter sido produzida com a participação do réu no decorrer do processo. Os indícios apresentados na denúncia do Ministério Público, que deu origem ao processo, precisam ser confirmados.
Os ministros do Supremo estão assustados com o "clamor público" para que Collor seja condenado. Alguns não escondem o temor de que o plenário opte por um julgamento político e condene Collor sem as provas materiais. Outros, no entanto, lembram que o ônus da prova cabe à acusação, no caso, o Ministério Público. Para estes, condenar Collor sem provas seria retornar à ditadura, quando prevalecia o princípio de que ao acusado cabia provar sua inocência.
Outro lado
O procurador-geral da República, Aristides Junqueira, chefe do Ministério Público, não foi encontrado pela reportagem da Folha. Sua assessoria informou que ele estava reunido com o Conselho Superior do Ministério Público. A reunião só terminaria após as 20h. A assessoria de Junqueira foi informada do teor da reportagem.

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